Sempre me agradou no Manic Street Preachers a manutenção do controle criativo em detrimento do sucesso comercial. A carreira foi marcada por postura anti-marketing, numa mistura sonora que unia Punk, Glam Rock oitentista, Hard, Indie-Rock e Grunge, além do posicionamento político combativo (mais orientado à esquerda, mas muitas vezes de postura bastante anarquista). A postura iconoclasta da banda foi bruscamente interrompida quando o problemático guitarrista Richey Edwards desapareceu, em fevereiro de 1995. Haviam lançado meses antes seu álbum mais incensado, comercialmente falando, The Holy Bible (1994).
Richey nunca foi encontrado, e as autoridades o declararam “presumivelmente morto” em 2008.
A banda seguiu inabalável na imposição do controle criativo de sua obra. Mas a imagem mudou, o som incorporou elementos de Rock de arena, e a banda criou hinos e álbuns grandiosos.
E, ainda que nunca tenham sido um nome gigante nos EUA (ou por aqui!), são gigantes no Reino Unido. Seus álbuns são sempre aguardados, seja por conta da qualidade das canções, ou por conta de um eterno sensacionalismo em torno da sombra de Richey Edwards.
Em Journal For Plague Lovers, de 2009, a banda revisita pela primeira vez, desde 1994, material deixado por Richey: James Dean Bradfield, Nicky Wire e Sean Moore (guitarrista/vocalista; baixista/eventual vocalista e baterista, respectivamente) musicaram os que, talvez, tenham sido os últimos escritos de Edwards – talvez num intento de matar a saudade, talvez num gesto comercial apelativo para as massas.
Fato: Journal For Music Lovers é o melhor álbum dos Manics, desde Holy Bible.
As comparações dos álbuns se iniciam já no trabalho gráfico: a arte da capa é novamente da pintora britânica Jenny Saville. Além disso, a tipografia (com a letra Я invertida) e uma citação poética na contra-capa emulam a capa de 1994 (“Uma vida gasta cometendo erros não é apenas honrosa, mas mais útil que uma vida gasta fazendo nada”, citação de George Bernard Shaw, escritor socialista irlandês, citado na contracapa).
Em ‘Journal’, os Manics revisitam o Rock básico, mais abrasivo e cínico – similar ao que faziam em ‘Bible’, sem simplesmente soar revisionista. É como um fechamento de ciclo, carregado de emoção e honestidade.
Steve Albini produziu a maior parte do álbum e, para surpresa de muitos, é talvez o disco mais límpido que o barulhento produtor tenha feito! Apesar da tradicional estridência e crueza das produções que Albini se envolve, a qualidade sonora e a audição de cada instrumento é clara como o dia. A escolha de Albini não deve ter sido à toa: era um dos produtores favoritos de Edwards.
As difíceis e metafóricas letras de Edwards falam de sua anorexia (“Facing Page: Top Left” e “All is Vanity”), usa personagens como o ator Marlon Brando e a novelista (daqueles romances eróticos de bolso, muito comum nos anos 80) Jackie Collins e, a partir disso, dispara em espiral para temas como consumismo, traições, dismorfia e suicídio. A música mais difícil do álbum, aliás, é “William’s Last Words” que, segundo Bradfield, teve que passar os vocais para Wire, pois a carga emocional não o permitiu cantá-la.
Outros destaques: a Grunge “She Bathed Herself In a Bath of Bleach” e a Pop-difícil “Virginia State Epileptic Colony”.
+++ Leia sobre ‘Resistance is Futile’, do Manic Street Preachers
Ainda sobre a produção de Albini, me chama muito atenção a faixa “Me And Stephen Hawkins”: não acho que tenha sido inspiração ou plágio, mas se parecem DEMAIS com um mix de “Treehouse” e “The Plan”, ambas do álbum High Low, do Nada Surf, de 1996 (que foi produzido por Ric Ocasek, produtor que geralmente tem proposta oposta à crueza de Albini!).
Por fim, a arte da capa chegou a ser proibida em alguns países, ao que parece ser uma provocação para sempre colocarem os Manics em alguma encrenca!
Ano | Selo: 2009 | Columbia
Faixas | Duração: 13 | 39:34
Produtor: Steve Albini e Dave Eringa
Destaques: “Peeled Apples”, “She Bathed Herself In a Bath of Bleach”, “Virginia State Epileptic Colony” e “William’s Last Words”
Pode agradar fãs de: Indie-Rock, Stereophonics, Suede, Pulp, Mansum
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