‘A Sala dos Professores’ é um suspense enervante sobre as dinâmicas de convivência


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Drama com altas doses de tensão, ‘A Sala dos Professores’ é uma história de mistério direta, ágil e sem rodeios

Representante da Alemanha no Oscar 2024 de Melhor Filme Estrangeiro, A Sala dos Professores é um drama social que sabe usar várias características da narrativa de suspense sobre uma situação mal explicada que vai crescendo, adquirindo proporções assustadoras e fugindo totalmente ao controle de todos os envolvidos.

Apresenta um história de mistério direta, ágil e sem rodeios, tornando muito fácil a imersão do público. Porém, a facilidade em se conectar com a história, que versa inicialmente sobre uma suspeita de pequenos furtos no colégio, carece de uma certa contextualização. Afinal, em que consiste a educação pública alemã atual? Qual é a composição do alunado nestas escolas? Qual é a orientação pedagógica que os professores trilham para lidar com este alunado?

Atualmente, sabemos que cerca de 30% da população total Alemã é composta por imigrantes ou por filhos de progenitores imigrantes ou estrangeiros e isso obviamente se reflete na composição das turmas de escolas públicas, visto que imigrantes normalmente constituem grande parte da mão de obra explorada pelos meios de produção local e, portanto, não conseguem pagar pelo ensino particular.

Para um maior aprofundamento no tema, sugiro o extraordinário documentário Sr. Bachmann e Seus Alunos (2021), que mergulha no dia a dia de um professor, cuja turma é toda composta por imigrantes, incluindo até alguns brasileiros. O citado documentário mostra de que forma isso afeta questões básicas do ensino, como o simples fato de se fazer entender, de comunicar, de estabelecer relações de respeito e de conquistar a confiança dos alunos, pais e responsáveis.

Questões complexas, mas que encontram muitas respostas na orientação pedagógica extremamente humanista adotada pelo corpo docente na tentativa árdua de dar a mínima sensação de pertencimento aos alunos.

Leonard Stettnisch e Leonie Benesch em 'A Sala dos Professores' (2023)
Leonard Stettnisch in A Sala dos Professores (2023)

Impregnada por este olhar humanista e inclusivo, a protagonista, uma professora idealista e propensa a ser sempre justa com todos, desconfia que as acusações de furto que alguns professores estão direcionando a determinado aluno não são coerentes. Decidida a esclarecer a situação ela produz uma prova, baseada em filmagem ilegal, de que a verdadeira culpada seria uma das funcionárias com livre acesso a sala de professores.

Certa de que está contribuindo para um mundo mais justo, a professora finalmente começa a sentir todo o peso de uma instituição educacional se voltando de várias formas contra ela, afinal, o ladrão não é mais um mero imigrante e, graças a (meia) denúncia dela, essa inversão de valores vem à tona de maneira irreversível, colapsando todo um sistema.

Para não entrarmos em terreno de mais spoilers, visto que a grande virtude do filme é a de surpreender e intrigar mais a cada novo acontecimento, é possível notar o desespero da professora diante de sua perda de “poder”. O poder inicial, que vinha da segurança de estar no controle de uma situação complicada, vai sumindo e se invertendo de forma sufocante, graças a uma direção que opta por não fazer nenhuma cena fora dos muros da escola, mesmo que a história se passe em alguns dias, tornando aquele ambiente uma espécie de prisão inescapável.

A ótima atriz Leonie Benesch, que faz a professora, entrega uma interpretação muito delicada sobre alguém que está prestes a explodir de raiva e pânico mas não pode se dar ao luxo de externar nada disso. Sem espaço para pedidos de socorro, os julgamentos informais passam a ser proferidos por todos os lados.

As cenas da famigerada reunião de pais e mestres e da entrevista perigosamente parcial que a professora cede ao jornalzinho da escola, estabelecem mais ainda a inversão da natureza das relações entre o alunado e o corpo docente, estabelecendo que as dinâmicas de poder dos primeiros são muito maiores do que as dos últimos citados. Não é a toa que a controversa última cena envolve uma releitura da imagem de um “rei” sendo carregado em seu trono.

+++ Leia a crítica de ‘Zona de Interesse’, de Jonathan Glazer

A Sala dos Professores, além de ser um dos filmes mais tensos do ano, em suma é sobre a fragilidade das relações humanas quando estas dependem de instituições ainda mais fragilizadas do que aqueles que as compõem e que, portanto, falham miseravelmente na nobre função de zelar pelo bem comum, mesmo quando esse bem aponte para direções opostas.

CLIQUE PARA ASSISTIR AO TRAILER

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FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

TÍTULO ORIGINAL: Das Lehrerzimmer / The Teacher’s Lounge
ANO: 2023
GÊNERO: Drama
PAÍS: Alemanha
IDIOMA: Alemão
DURAÇÃO: 1:38 h
CLASSIFICAÇÃO: 12 anos
DIREÇÃO: Ilker Çatak
ROTEIRO: Johannes Duncker e Ilker Çatak
ELENCO: Leonie Benesch, Anne-Kathrin Gummich, Rafael Stachowiak, Rafael Stachowiak e outros
AVALIAÇÕES: IMDB

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