‘Give a Glimpse of What Yer Not’ e a receita da longevidade do Dinosaur Jr.


Quando é hora de parar? Quando uma banda deve encerrar as atividades?

Às vezes as bandas estendem seus serviços por demais, entregando trabalhos desastrosos.

O Dinosaur Jr., porém, já passou pelo fim algumas vezes. O primeiro fim foi “não declarado”: Lou Barlow (baixo) e J. Mascis (vocal e guitarras) se desentenderam e o primeiro saiu da banda, exatamente no momento em que assinam com um grande selo, durante a ascensão do Rock Alternativo nos anos 90. Naquele período, a moral da banda era tanta, que o Nirvana abria shows para eles.

O segundo fim foi quando J. Mascis, num ímpeto de general, resolve por fim na banda no final daquela década e passou a se apresentar solo, com uma banda de apoio chamada The Fog.

Barlow, ressentido, montou projetos interessantes: o Folk Implosion e o Sebadoh, este ainda durante os anos finais com o Dinosaur Jr. Durante seus shows, vivia destilando ódio e ressentimento a Mascis, e a imprensa adorava!

Mas um acidente de carro, na Alemanha, em 2001 (durante turnê com o The Fog), quebrou duas vértebras de Mascis. Depois disso, após sua recuperação, ele começou a aparecer nas apresentações de Barlow. Em 2002, os (então reformados) Stooges chamaram os dois ex-comparsas para dividir o palco numa performance de “I Wanna Be Your Dog” (o grande Mike Watt, que tocou com Mascis numa das formações do Dinosaur Jr. foi quem os reaproximou). Dali em diante, o Dinosaur Jr. renasceu e, logo, uma reunião da formação original aconteceu, em 2005.

Até aqui, a banda não tinha álbuns ruins. Ao contrário, era uma das grandes referências da cena alternativa. Se os anos de independência apresentaram a relação perfeita entre ruído + dissonância + melodias, os anos na Sire (praticamente trabalhos solo de Mascis) propuseram a fusão do som inicial com solos apoteóticos, melodias psicodélicas e ganchos pop perfeitos.

O mais interessante é como se desenvolveram esses trabalhos, para um grupo que se separou diante de tantos desentendimentos: Barlow já declarou que entende que ele e Mascis não são amigos. Que não precisam se gostar. Apenas serem profissionais, respeitarem as opiniões um do outro. Diante disso, os álbuns de “retorno” do Dinosaur Jr. contradizem aqueles que, como eu, acham que banda longeva acaba pisando no tomate.

A perfeição viria em 2016, com Give a Glimpse of What Yer Not, quarto álbum desde o retorno em 2005. Todas as canções são destaques, não há nada errado, fora do lugar, ou mesmo pontos baixos. Os riffs nervosos, da mais perfeita combinação de Black Sabbath com Crazy Horse, estão aqui. Os solos apoteóticos, cheios de feeling, também. Os ganchos pop, propositalmente criados para desgraçar uma melodia no seu cérebro incansavelmente, estão por toda a parte.

O álbum inicia com os dois singles: “Goin Down”, com riffs absolutamente ruidosos e grudentos; e “Tiny”, pop até a medula, ensolarada, mas que soa até provocativa à Barlow (em versos que dizem “sinto que não posso ser seu amigo por muito tempo”). “I Told Everyone” caberia facilmente nos álbuns Where You Been (1993) ou Without a Sound (1994), dos anos sem Barlow.

Este, porém, crava sua marca em duas canções de sua autoria, a majestosa “Left/Right” (que caberia em ‘Bakesale’, do Sebadoh) e o esplêndido Folk Rock “Love Is…”, com um dos solos mais bonitos do álbum (ok, alerta de redundância), e com o refrão mais fácil do disco.

+++ Leia a crítica de ‘Sweep It Into Space’, do Dinosaur Jr.

É perceptível que Mascis, Barlow, e também Murph (baterista) tem química juntos. O baixo marcante e raivoso, mas cheio de notas dedilhadas de Barlow é o complemento perfeito para o emaranhado de riffs e ruídos idiossincráticos de Mascis. Seus vocais atonais e por vezes claudicantes talvez soem mais confiantes quando estão juntos. Três díspares que soam únicos quando estão juntos.

É assim que tem que ser! Por muitos anos.


 

 

Ano | Selo: 05/08/2016 | Jagjaguwar
Faixas | Duração: 11 | 46:12
Produtor: J. Mascis
Destaques: “Goin Down”, “Tiny”, “Left/Right”, “Love is…”
Para quem gosta de: Rock Alternativo, Gumball, Nirvana, Sugar

 

 


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