‘There Is Nothing Left To Lose’ é o Foo Fighters mínimo, antes das grandes arenas


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Crédito: Danny Clinch

É muito comum, hoje em dia, falarem mal do Foo Fighters. “Superestimados”, “repetidores de fórmulas”, “dependentes do carisma de Dave Grohl” ou, a mais cruel de todas, “filhotes do Nirvana”. Mas saiba que nem sempre foi assim.

Quando a banda surgiu, quase que de surpresa, em 1994, com Dave Grohl gravando todos os instrumentos, era vista como promessa do Rock Alternativo. E, ainda que caminhasse por um terreno sedimentado pelo Grunge e, claro, pelo Nirvana, é inegável que, desde o início, Dave Grohl soube dar identidade ao seu projeto.

A banda passou por inúmeras formações, até chegar no formato “sexteto” da última década. Sim, o Foo Fighters é uma banda de quase três décadas de existência – um dinossauro, então!

Grohl tem o posto de “o cara mais gente fina do Rock”, mas é assumidamente controlador e perfeccionista.

Voltemos no tempo. Em 1997, o amigo de longa data Pat Smear deixou a banda (retornou em 2007, e permanece) logo após as gravações do segundo álbum,  The Colour And The Shape (1997), alegando exaustão. Em seu lugar entrou Frank Stahl, com quem Grohl havia tocado na banda de Hardcore Scream. Stahl também não durou na banda, sendo dispensado por Grohl em 1998. Além disso, o controle de Grohl era tamanho que chegou a regravar partes da bateria de William Goldsmith no álbum em questão, o que levou o baterista a romper com o líder. É fato também que a dispensa aproximou Grohl e o então desconhecido baterista da canadense Alanis Morissette, Taylor Hawkins.

Isso tudo nos leva a 1999, ano em que a banda passava por essa turbulência. Reduzida a um trio, com Grohl (guitarras e vocais), Taylor Hawkins (bateria) e Nate Mendel (que chegou ameaçar retornar para sua ex-banda, o ótimo Sunny Day Real Estate), o Foo Fighters precisou ser resiliente e, porque não, se reinventar para seguir a trilha de sucesso que vinha construindo, ainda que, até esse ponto, fosse uma banda de nicho, não uma banda de arenas.

There Is Nothing Left To Lose, de 1999, é o álbum composto pela banda nessas condições: um trio em frangalhos. Ainda enérgico, ainda cheio de riffs e com mistura certeira de rock-refrão-melodias, mas apresentando características que não tinham apresentado em nenhum trabalho, até então: introspecção, simplicidade, abordagens mais suaves, mais polidas.

“Stacked Actors” abre os trabalhos brilhantemente. Com guitarra e baixo distorcidos “pra frente” de tudo, e uma bateria seca de Taylor Hawkins, a banda entrega muito barulho nos refrãos, uma melodia quase bossanovista nas estrofes, e um solo barulhentíssimo e ensurdecedor. O curioso é que nada disso torna a música indigesta. Ao contrário, é uma ótima canção pop.

Mas pop mesmo é “Breakout”, a segunda faixa. Um hit instantâneo, incontestável.

“Learn To Fly”, o primeiro single, é perfeita em absolutamente tudo: tem punch, apelo comercial, uma ótima letra melancólica, que se traveste na energia da música e no excepcional videoclipe produzido para a canção. “Gimme Stitches” aposta na simplicidade, no refrão fácil, e soa como uma canção Rock de filme adolescente dos anos 80, e isso é um elogio!

E o que falar de “Generator”? Dave Grohl usa uma Talk Box com sua guitarra, dando um efeito único ao riff principal da música. Ele diria mais tarde que o fez por sua admiração a músicos como Peter Frampton e Joe Walsh. Era o Foo Fighters crescendo, amadurecendo e apontando para o que fariam anos mais tarde.

Para mim, as maiores surpresas do álbum são as lindas baladas “Aurora”, “Ain’t The Life” e “Last Year”. Repletas de melodias, romantismo e simplicidade, em ambas o menos é mais, não há inovação ou invenção de um novo estilo, mas o uso perfeito de acordes para formar power ballads incontestáveis: ganchos, pontes, refrão grudento, letra fácil e repetitiva. A banda já havia tentado baladas anteriormente (“Big Me” e “Walking After You”), mas aqui acertam a artéria.

Grohl, Mendel e Hawkins gravaram tudo num porão. Era a primeira vez que Grohl usava seu “Studio 606”. A atmosfera de leveza e não cobrança entre os três tornou o processo de gravação tranquilo. Grohl repetiria essa atmosfera anos depois, num outro momento da banda, para gravar Wasting Light (2007). Curiosamente, são dois dos álbuns mais conceituados da discografia da banda.

“There is Nothing Left To Lose” foi premiado com o Grammy de Melhor Álbum de Rock de 2001, e “Learn To Fly” também levou o prêmio de Melhor Vídeo de Rock. O álbum consolidou o Foo Fighters, que, daqui em diante, apenas cresceu em popularidade e em sonoridade. Além disso, apontou o trio como espinha dorsal da banda, só desfeita com a morte de Hawkins, em 2022.

+++ Na coluna Prazeres Plásticos, leia sobre ‘Down on the Upside’, do Soungarden

Em 2001, durante a turnê deste álbum, a banda se apresentou no Rock In Rio 3 para cerca de 100.000 pessoas, com a mesma energia de quando se apresentavam em clubes para 200 pessoas. É por isso que esse álbum representa o ponto de mudança do Foo Fighters, de banda de nicho para uma banda de arenas.

Foo-Fighters-There-Is-Nothing-Left-To-Lose-Artwork

FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

ANO: 1999
GRAVADORA: Roswell / RCA
FAIXAS: 11
DURAÇÃO: 46:16 min
PRODUTOR: Foo Fighters / Adam Kasper
DESTAQUES: “Learn To Fly”, “Breakout”, “Next Year”,”Generator”, “Ain’t It The Life”
PARA FÃS DE: Grunge, Punk Rock, Rock Alternativo, Emo, Hard Rock

 

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