Formada do final de 2012, a banda feirense Novelta tem na bagagem três singles e um EP (Quintais Abertos, 2015), além de participação na coletânea/tributo “As Lembranças São Escolhas”, do selo/site Scream and Yell, somado a várias apresentações no estado e em outros.
Com influências das guitarras graves que destilam distorções fuzz e as batidas secas do stoner rock, a Novelta compõe canções que falam da realidade do Nordeste, de suas crenças, suas mazelas, suas ilusões; e do sol que reina na maior parte do ano, que faz arder a terra, e que nasce a cada dia trazendo esperança de dias melhores. Agreste rock? Conheçam um pouco mais sobre a banda.
Formação: Wendell Fernandes (voz e guitarra), Luyd Andrade (guitarra e voz), Eduardo Quintela (baixo) e Luciano Cotrim (bateria)
Após três singles e um EP entre 2013 e 2015, a Novelta parecia uma banda inquieta, de repente um silêncio de mais de dois anos, o que aconteceu com a Novelta de 2015 até aqui?
R. Resolvemos dar um tempo. Alguns de nós até se meteram em outros projetos, mas basicamente aconteceu o que acontece com muitas bandas, as demandas pessoais e profissionais começaram a exigir demais da gente. Eu pessoalmente me senti sufocado a ponto de não conseguir ter tempo para fazer música com a qualidade que eu queria fazer. Muitas pessoas não sabem o sacrifício que temos que fazer para conseguir colocar para fora algo relevante. Tocar é simples, tocar bem é obrigação, fazer música, já tem um monte de gente fazendo… A gente sempre teve vontade de mais, de ser um nome no rock do estado, algo pra ser lembrado depois… Como Úteros em Fúria, Dead Billies, Clube de Patifes, Cascadura e etc.
As ideias que levaram ao surgimento da banda continuam ou mudaram após esses anos, inclusive após a saída de Felipe e Cordeiro?
R. Sim, acredito que mantêm-se. Nossas influências são vastas e elas mesmas não paravam/param quietas e acho que esse será o nosso jeito de ser também, caso consigamos ter uma vida longa. Tudo depende muito de quão criativos poderemos ser e como vamos utilizar essa criatividade em prol da estética sonora. Atributos técnicos novos, novos instrumentos e etc. Acredito que a saída dos caras não é um vetor de mudança, Filipe e Cordeiro são dois grandes amigos nossos. Inclusive Filipe compõe muita coisa comigo, trocamos ideias sobre música… eu costumo mostrar coisas que fiz a ele e ele dá sempre uma luz na coisa… Enfim, os caras ajudam sempre que podem.
A Novelta passa uma imagem de banda “fechada”, séria, por uma série de fatores. A banda dos caras “sisudos”, algo que talvez seja não intencional e nem seja de todo verdade. Como vocês analisam isso?
R. Acho isso bastante estranho (rs). Talvez até seja culpa minha… eu tenho cara de mau humorado (rs). Na verdade é foda conversar sério com todos nós juntos. A gente faz piada com tudo… até de nós mesmos. Havia uma hashtag de nome #noveltadazoeira de tanta zoeira que a gente fazia. Acho que estamos aparentando seriedade porque estamos falando pouco esses tempos. Passamos por esse período de reestruturação, ficamos algum tempo em estúdio, compondo e gravando. Resultado disso foi uma música numa coletânea bem legal chamada “As Lembranças São Escolhas” que saiu pelo site indie “SCREAM & YELL”. Estamos lá entre nomes como Lemoskine, da Banda Mais Bonita da Cidade, Nevilton, Anacrônica, Valciãn Calixto… uma galera fantástica. Também tá pra sair um single novo, que foi produzido por Cadinho Almeida, do Cascadura. No mais, estamos vivendo nosso tempo, tentando produzir, como disse lá acima, algo que seja realmente relevante. Estamos tensos, daí talvez essa ‘seriedade’ de um porco mijando (rs).
Teve um show de vocês com um terceiro guitarrista, a minha percepção foi que a terceira guitarra adicionou novas texturas às canções. Vocês abandonaram a ideia, o que houve?
R. Bem, nossa ideia com aquilo era experimentar. Três guitarras daria liberdade para eu ou os caras usar teclas e o lapsteel em algumas músicas. Infelizmente não conseguimos concluir esse projeto. Fam Motta acabou tendo que sair, por motivos de demandas pessoais. Uma pena, mas não foi descartado totalmente. Quem sabe qualquer hora a gente volte a ser cinco novamente.
Como surgiu a ideia de fazer o clipe de “Santos Populares” no Bando Anunciador?
R. Foi meio que no susto… Faltava uma semana ou duas para o Bando Anunciador, e numa dessas costumeiras idas de Zé Cordeiro a minha casa, ele largou a ideia. Parece que tinha acabado de tê-la, chegou eufórico e despejou tudo… ligamos pra Dudu e ele topou fazer. Ele quem amarrou a coisa toda. Saímos para fazer a pré-produção as pressas… Eu desenhei a máscara, achamos o ator, explicamos a ele o que era e como e o que tinha que fazer. Acabou que ficou bem bonito… serve inclusive como um registro do que é o Bando… Tudo isso é muito mérito de Dudu e Zé.
As letras trazem embutida uma crítica social sutil e falam das dificuldades enfrentadas pelo povo nordestino. Em “Santos Populares” encontramos os versos: “Versa melhor quem a chama ‘princesa comercial’. Onde o que importa é ter!”. O que poderiam falar a respeito?
R. Eu tenho um posicionamento político bastante claro… Os caras também. O “Quintais Abertos” é todo sobre isso, sobre o trabalho, sobre como nos relacionamos uns com os outros, sobre nossa relação com os poderes constituídos e nossa relação com a natureza… Não é fácil ser nordestino, ainda mais do Brasil profundo… e não dá pra gente fazer música e não falar sobre isso. É a nossa proposta.
As músicas de vocês trazem referências do stoner rock, mas com letras cantadas em português e que falam da realidade local, especificamente do sertão e suas características, algo também explorado na parte de identificação visual: capas e vídeo. Parece haver um conceito por detrás de tudo. Esse conceito permanecerá?
R. D’uns tempos pra cá, o stoner rock se tornou algo mais popular, mas lá nos anos 90 eu já tinha uma banda que tocava ‘First It Giveth’, do Queens of The Stone Age. Eu acho que o stoner rock é uma ferramenta de conexão com os anos 70’s. Desde o uso do Fuzz, das baterias secas, se emendando a riffs de guitarra e baixo bem diretos… Quando nos juntamos pra tocar, conversamos muito sobre o que seria isso que a gente queria fazer. Pensamos em muitos detalhes, sobre estética, sonoridade, muita coisa mesmo… É bom que essa mensagem consiga está sendo passada. Cantar em português foi a forma de nos apropriar do discurso, não faria qualquer sentido pra gente fazer isso numa língua que não fosse a nossa. Pensamos num jeito de realizar isso de forma globalizada (rs)… inclusive um dos designers que trabalhou com a gente é de Portugal… Não estamos tentando inventar a roda, estamos apenas usando ela pra nos locomover em um direção definida previamente.
Novelta sempre é citada como stoner rock, vocês até tocaram uma cover do Queens of the Stone Age, talvez o maior ícone desse tipo de som, como vocês encaram a associação? Não acham limitante o rótulo? Já pensaram em incorporar elementos da música nordestina nos arranjos?
R. Antes víamos isso como algo imprescindível. Estrategicamente queríamos ser associados a essa massa, mas agora não estamos tão preocupados em que prateleira vão nos colocar. O QOTSA nem é tão mais uma referecia latente, acho que nosso novo desafio é encontrar nossa própria forma de contar essa história. Acho que nem o QOTSA está preocupado em ser o QOTSA (rs)… Podemos ouvir isso nos trabalhos mais recentes deles. Sobre os elementos de música nordestina, posso afirmar que eles estão lá, sendo traduzidos, claro. O arranjo de guitarra de ‘Santos Populares’ foi feito pensando numa sanfona, mas executado por uma guitarra. Uma coisa sempre esteve clara pra gente, falar de um nordeste sobre uma ótica própria, sem aquelas caricaturas clássicas… sem as negar, essas referências são tão importantes pra gente quanto todo o rock que a gente já ouviu… de Black Flag a Alceu Valença…
Ainda seguindo o raciocínio da pergunta anterior, é comum as pessoas comentarem que “as bandas nacionais estão sempre imitando bandas gringas, não trazendo nada de novo”. Se analisarmos as bandas, em seu surgimento, em geral, tem um som pautado em algumas referências, precisando lançar alguns discos, fazer shows, para encontrarem seu “próprio som”. O que vocês acham da afirmação? E a Novelta já encontrou seu “próprio som”?
R. Eu realmente procuro no mundo inteiro algo que seja novo e que não tenha uma pitada clara de algo que você não conheça. QOTSA tem muito do Black Flag, do Sabbath. Tem música do Foo Fighters que parece coisa do George Harrison. Greta Van Fleet e Rival Sons é Led até o talo. Para os gringos é fácil, eles nascem com outros tipos de acessos técnicos e sonoros. A gente aqui mata um leão para ter e fazer o que quer. Acho uma puta injustiça a maneira com que os críticos brasileiros tratam os artistas de rock nacional. Inclusive essa visão de que o ‘de fora’ é bom é um erro… temos aí a Far From Alaska, o Boogarins, a Maglore e o Vivendo do Ócio tocando em festivais fora do Brasil… e outra 3 das 4 que citei são bandas daqui do Nordeste. Durante uma caralhada de tempo via nas ‘revistas’ especializadas um tratamento que nem consigo dar um nome, para as bandas de stoner rock… tratavam como se estivessem vendo algo bisonho ou deslocado… sei lá… Tou citando isso pra dizer que nem tudo que se lê sobre algo é relevante. Escreve-se e fala-se muita bobagem sobre música… É realmente foda ser original, mas se você for original demais, pode se tornar alienígena e sabemos bem como os alienígenas são tratados nos filmes… não é? Já no mundo real, a gente vai aparecer somente numa foto turva e distante, com apenas meia dúzia de maluco jurando que existe.
Nesses cinco anos de existência, quais as maiores conquistas da banda? Vocês esperavam estar mais “longe” ou está dentro do planejado?
R. A gente viveu muita coisa legal, tocando por todo estado e fora dele, com resenhas do nosso trabalho escritas em sites internacionais e saindo em diversas listas de ‘melhores lançamentos’ em 2015. Fizemos muitos amigos, colegas, contatos… conhecendo lugares e pessoas especiais. Confesso que a gente poderia ter feito mais coisas e eu só não sei como isso poderia ter sido feito… acho que a matéria prima para boa música, além de algum talento, é o tempo. Sem tempo, não há talento que floresça. A gente precisa chegar mais longe… aumentar nossa relevância no estado e talvez no país, mas a chave disso é a música, então por hora, estamos sisudos e trancados em salas acústicas tentando cria-las (rs).
Além de shows, quais os planos futuros da banda? Algum single, EP ou álbum no horizonte próximo?
R. O lançamento do single se avizinha. Estamos em processo de conclusão… Ele vai contar um pouco sobre esse novo trabalho que estamos preparando e tudo que queremos pra já é que ele seja ouvido pelo máximo de pessoas possível, depois disso nos acompanhará quem gostar. Não estamos tentando fazer um trabalho hermético, ainda acreditamos no rock que fazemos e ele foi feito pra conversar com as pessoas. Assim, temos um planejamento pra 2018, com a visão de nos deixar mais ‘sofisticados’ e explorar coisas que sempre tivemos vontade, mas que até aqui, não tínhamos tido como realizar.
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Apresentação no Programa VandexTV
Coletânea “As Lembranças São Escolhas…”
:: Assista de vídeo de “Santos Populares”:
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