‘Corredor Polonês’, o inclassificável e cultuado álbum da Patife Band


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O Corredor Polonês foi definido no Tratado de Versalhes, assinado no final da Primeira Grande Guerra, e anexou à Polônia um trecho de terra até o Mar Báltico, antes pertencente à Alemanha. E a Polônia foi violentamente atacada, anos depois, pelas tropas nazistas de Hitler, iniciando a Segunda Grande Guerra.

Corredor polonês virou também expressão adaptada ao cotidiano brasileiro, que remete à violência, e que nos faz imaginar um caminho estreito que, ao passarmos, somos violentamente atingidos por porradas distribuídas a esmo.

(…)

Nos anos 80, em São Paulo, os irmãos paranaenses Arrigo e Paulo Barnabé fizeram parte da idiossincrática cena musical conhecida como Vanguarda Paulista, que, sendo bastante reducionista, produzia música e arte experimental, fora dos padrões ortodoxos impostos pela indústria cultural.

Paulo Barnabé teve algum envolvimento com o Punk Rock. Chegou, por um curto tempo, tocar contrabaixo nos Inocentes.

Suas propostas musicais não ortodoxas, sem preocupação com rimas ou métricas lineares, somadas às atitudes niilistas dos punks da época, resultaram na formação de uma das bandas mais curiosas e impressionantes que já existiram, a Patife Band.

Primeiramente chamada de Paulo Patife Band, a banda inicialmente deu vida a músicas aproveitadas (ou não) em projetos de Paulo, Arrigo e Itamar Assumpção. Um primeiro EP foi lançado em 1985, homônimo. Esse EP, feito de forma independente, acabou caindo nas mãos do produtor Pena Schmidt, que imediatamente entrou em contato com Paulo para fazerem um álbum cheio.

Nascia Corredor Polonês, álbum de 1987 da Patife Band.

Jazz, Punk, Jovem Guarda, Hard Rock, Pós-Punk, música percussiva, atonalismo, letras e interpretações sufocantes, letras que exploram personagens e situações urbanas e cotidianas. Tudo isso envelopado com uma característica pop e muita ironia.

Regravados por Cássia Eller (“Teu Bem”), Ratos de Porão (“Tô Tenso”), a Patife Band vem sendo redescoberta cada vez mais. Corredor Polonês é um álbum que, inexplicavelmente, só teve uma única tiragem em vinil em 1987 (disputada a tapas em sebos mundo afora), e um também único relançamento em CD, em 2001, ambos pela Warner Music. Em 2005, “Teu Bem” e “Poema em Linha Reta” foram incluídas na coletânea britânica The Sexual Life of the Savages: Underground Post-Punk of São Paulo.

Corredor Polonês é um álbum que explora e explica o Pós-Punk e até o pop brasileiro. Não é injusto afirmar que bandas consagradas (como os Titãs, por exemplo) foram altamente influenciados pela musicalidade e teatralidade da Patife Band, já que todos foram contemporâneos numa mesma cena musical.

O álbum abre com a faixa título, sussurrada por Barnabé, e tem uma linha suntuosa e envolvente de baixo, contraposta por uma guitarra absolutamente aleatória. A música explode num ritmo forte e em breves ataques de raiva no vocal: “Preso fiquei no corredor polonês”. Preso fiquei, eu, no Corredor Polonês, quando ouvi esse álbum pela primeira vez…

“Pesadelo”, na sequência, é uma explosão de ritmos, uma “maluquice coordenada” e, de novo, aquele baixo suntuoso te fisgando pelo intestino. “Você não consegue dormir sem beber, já faz muito tempo que não”. É…

Seguimos, com “Chapéu Vermelho”, versão de “Lil’ Red Riding Hood”, originalmente da banda Sam the Sham & the Pharaohs, cuja versão foi feita pela banda paulista The Jet Black’s (sic), num Pós-Punk à lá The Cure fase Seventeen Seconds. De novo, os vocais sussurrados e assustados, que desta vez criam uma atmosfera de tensão para a letra quase infantil feita em 1966.

E chegamos em “Tô Tenso”, que tem absolutamente tudo ao mesmo tempo: guitarras ensandecidas, baixo amalucado, metais, bateria hardcore, letra urbana e auto depreciativa. É uma música incrível, e infelizmente não consigo encontrar adjetivos que traduzam o quanto essa música é foda.

Dela, desembocamos num poema de Álvaro de Campos (alter ego de Fernando Pessoa), musicado ao estilo Patife Band: “Poema em Linha Reta” é um Samba torto. Um Rock estranho. É, na verdade, como aqueles sonhos confusos que temos após bater uma pratada de feijoada gorda.

Nesse ponto, o jogo está ganho. A banda entrega mais cinco temas, dos quais destaco o hardcore-valsa-flamenco “Três Por Quatro”, o (cover da banda Excomungados) “Vida de Operário” (praticamente uma música sertaneja) e a obra prima “Pregador Maldito”.

É impossível catalogar a Patife Band num estilo ou vertente. É um som único, grooveado, nem sempre pesado, mas com complexidade digna de virtuoses, sempre com métricas improváveis, que certamente merecia mais sorte. Corredor Polonês é um dos álbuns de Rock Nacional mais cultuados hoje em dia. Uma breve pesquisa pode reduzi-lo ao Punk, ou ao Pós-Punk. Outras, um tanto mais ousadas, atribuem à Patife Band uma profetização do Math Rock.

Fato é, como num corredor polonês, tudo aqui é porrada.

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FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

ANO: 1987
GRAVADORA: WEA
FAIXAS: 10
DURAÇÃO: 28:09 min
PRODUTOR: Pena Schmidt
DESTAQUES: “Corredor Polonês”, “Tô Tenso”, “Pregador Maldito”, “Três Por Quatro”
PARA FÃS DE: Pós-Punk, Vanguarda Paulista, Punk Rock, Jazz, Hard Rock, Experimentalismo, Fusão de Estilos

 

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