‘Emily, A Criminosa’ explora o desespero de endividados frente ao capital transnacional


Aubrey Plaza em Emily, A Criminosa

Hollywood sempre bombardeou a cultura alheia com sua exemplar estrutura educacional. Dificilmente, alguém com cerca da minha idade (21) não passou parte da infância almejando estudar em uma escola como a de High School Musical ou em uma universidade como a de Harvard porque assistiu a Legalmente Loira. Pessoas mais velhas do que eu, provavelmente passaram pela mesma experiências com outras produções.

Atualmente, talvez esse encantamento com o sistema educacional dos EUA tenha diminuído, principalmente porque informações dificilmente são contidas e há um maior número de produções críticas. Hoje em dia, podemos ver Diane Ravitch, formuladora de um modelo educacional que perdurou por décadas nos Estados Unidos (e serviu de inspiração para outros países, incluindo, Brasil), afirmando que o sistema deu errado. Nos deparamos com um aumento crescente de tiroteios (que podemos ver em novas produções, como A Vida Depois) e algo que, talvez, em nossa infância/adolescência nunca nos contaram: os débitos estudantis, dívida que chegou a 1,7 trilhão de dólares em 2021 devido a 44 milhões de norte-americanos que não tem como quitar seus financiamentos, com juros acumulados.

Dado o horror da educação nos EUA, é impossível culpar Emily (Aubrey Plaza) por suas ações e nem é necessário que saibamos tudo que citei anteriormente para nos compadecermos com a situação. Esse trabalho, na verdade, fica a cargo de John Patton Ford, que conduz seu filme sem abrir margens para julgamentos.

Emily, A Criminosa não é sobre uma golpista, mas sim sobre uma pessoa que chega ao limite para conseguir existir em uma América que implode devido às consequências do neoliberalismo e a ascensão do capitalismo transnacional, onde a desregulamentação do trabalho reina, junto com o crescimento da miséria entre a  população excedente ao sistema.

Aubrey Plaza em Emily , A Criminosa
Aubrey Plaza em Emily , A Criminosa

Com uma dívida de 77 mil dólares por um curso que nem conseguiu concluir, Emily, dessa forma, é brilhantemente centralizada entre ser uma profissional sem trabalho formal – e, portanto, sem direitos assegurados – e estar bem próxima de tornar-se uma excedente, dado seu histórico criminal. Ford, desde o início, deixa nítido que não há possibilidade de Emily vencer, não de uma maneira ‘‘correta’’, como já estava tentando. Dessa maneira, ganhar em um dia o que ganharia em, provavelmente, três meses, pesou na decisão de uma pessoa que não tinha escolhas.

Sem moralismo algum por parte de Ford, somos entregues a um thriller comandando por Aubrey Plaza em mais uma brilhante atuação. Para Aubrey brilhar, Ford tem decisões interessantes do roteiro, para além da ausência de um valor moral. O diretor claramente não destina e nem tem interesse em explicar o crime organizado, tampouco está empenhado em entregar uma trama onde o crime importa mais que a sua protagonista.

+++ Leia a crítica de ‘Decisão de Partir’, de Park Chan-Wook

É dessa forma que Aubrey consegue uma atuação incrível e que cativa. A câmera está a todo momento acompanhando-a, observando seu dia-a-dia e suas preocupações. Mas a maioria das cenas, após seu aprendizado em aplicar golpes, não são voltadas aos próximos furtos, mas a sua tentativa de realinhar sua vida, dentro do que entendemos universalmente por correto, o que acaba surpreendendo e permitindo uma grande diferenciação de qualidade e imprevisibilidade em relação a outras produções que envolvem crimes.


Emily, A Criminosa - Poster

 

Título Original | Ano: Emily The Criminal | 2022
Gênero: Policial, Drama, Suspense
País | Idioma: Estados Unidos | Inglês
Duração: 1:37 h
Classificação: 14 anos
Direção: John Patton Ford
Roteiro: John Patton Ford
Elenco: Aubrey Plaza (Emily), Theo Rossi (Youcef), Bernardo Badillo (Javier), John Billingsley (Gerente), Kim Yarbrough (Secretaria)  e outros
Avaliações: IMDB | Rotten Tomatoes

 

 


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