‘As Bestas’ questiona a violência como solução dos conflitos


Marina Foïs e Denis Ménochet em As Bestas (2022)-2

Dirigido por Rodrigo Sorogoyen, ‘As Bestas’ foi vencedor do Cesar de Melhor Filme Estrangeiro em 2023

Em As Bestas, em um pequeno e degradante vilarejo na Espanha, há um clima desconfortável entre os poucos habitantes. Antoine (Denis Menochet) e Olga (Marina Foïs), franceses que se mudaram recentemente para o lugar, votam contra a venda de terras para uma companhia de Energia Eólica e bloqueiam um acordo que poderia tirar parte dos vizinhos da miséria. Antoine foi professor e enxergou no interior da Galícia uma espécie de ‘‘sonho de aposentadoria’’, seu objetivo com o local é se ter uma vida simples, vender seus produtos orgânicos na feira e reabilitar casas abandonadas para entregá-las para a população.

As ambições de Antoine são nobres. Entretanto, convém também pensarmos que, diferente de dele e de sua esposa, a população que permanece no vilarejo está ali pela falta de oportunidade, de perspectiva. A energia eólica é entendida como o que poderia garantir novas chances e o fim da miséria, mas Antoine está no caminho entre essas pessoas e seus direitos. Assim, As Bestas começa nos apresentando aquele clima desconfortável, onde Antoine sofre xenofobia constantemente e é prejudicado pelos irmãos Xan (Luis Zahera) e Lorenzo (Diego Anido) de inúmeras maneiras.

É uma situação complicada, sem dúvidas, Antoine comprou sua terra e tem direitos sobre ela, mas também é compreensível que a população o enxergue como um forasteiro que tirou chances de outras pessoas por mesquinhez. As Bestas conduz esse conflito, unindo um texto expositivo a uma condução mais fria, resumida em plano, contraplano, planos médios e gerais, valorizando sempre a ambientação decadente e, assim, construindo uma tensão que perdura por toda a produção. Nesse sentido, Rodrigo Sorogoyen consegue fazer jus ao título do filme, afinal, os desencadeamentos desse conflito pela venda das terras regridem homens a instintos, onde predomina a violência.

Luis-Zahera-Denis-Menochet-e-Diego-Anido-em-As-Bestas-2022
Luis Zahera, Denis Ménochet e Diego Anido em As Bestas (2022)

Desse modo, é interessante como Sorogoyen controla, até dado momento do filme, o descarregamento do ódio, das desavenças e consegue depositá-las em uma só pessoa, que é Antoine. No entanto, o filme cresce ainda mais quando demonstra coragem e consegue transformar a violência no que vem depois da violência. Ser cruel, ser uma ‘‘besta’’, sempre inclui alguém para sofrer, não se pode ser cruel sem ter uma vítima. E mesmo que essa brutalidade seja destinada a apenas uma pessoa, terceiros sempre estarão envolvidos, seja familiares ou amigos que serão impactados por isso. Assim, a substituição do protagonismo, que passa com muita efetividade de Antoine para sua esposa, Olga, apresenta uma carga dramática que não está mais associada a ameaças ou violência física. Esses temas estão presentes, é claro, mas é mais sobre o que vem depois disso.

Sorogoyen é bastante perspicaz em trazer para o centro da tela mulheres que foram secundarizadas pelo filme inteiro e, no caso de Olga, pelo seu próprio marido. É uma visão bastante interessante do diretor, afinal, se pensarmos na própria história contemporânea da Espanha, todo ato generalizado de brutalidade entre homens, como a guerra civil e a própria ditadura, recaíram nos braços de mulheres, principalmente em mulheres de pequenas vilas. Essas mulheres se tornaram figuras centrais para a família, mesmo perdidas, mesmo desamparadas.

+++ Leia a crítica de ‘Monster’, de Kore-eda Hirokazu 

Em As Bestas, Sorogoyen faz o mesmo, mas sem deixar que a figura de Antoine simplesmente desapareça. Assim como Olga, sentimos o peso de sua ausência e refletimos sobre a obsessão milenar dos homens se destruírem para resolverem problemas, como se não houvesse um outro tipo de solução.

CLIQUE PARA ASSISTIR AO TRAILER

As-Bestas-Poster

FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

TÍTULO ORIGINAL: The Beasts
ANO: 2022
GÊNERO: Drama, Suspense
PAÍS: Espanha / França
IDIOMA: Francês / Galego / Espanhol
DURAÇÃO: 2:17 h
CLASSIFICAÇÃO: 14 anos
DIREÇÃO: Rodrigo Sorogoyen
ROTEIRO: Isabel Peña e Rodrigo Sorogoyen
ELENCO:  Marina Foïs, Denis Ménochet, Luis Zahera, Diego Anido e outros
AVALIAÇÕES: IMDB

Previous LANÇAMENTOS DA SEMANA: Sleater-Kinney, Bolts of Melody, The Fauns & mais
Next The KVB anuncia 'Tremors' e lança o single "Labyrinths"; Saiba mais

No Comment

Leave a reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *