‘Room on Fire’ e as cobranças ao The Strokes após um sucesso estrondoso na estreia


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Crédito: Anthony Pidgeon / Redferns

Vários na história passaram por isso, mas arrisco dizer que a última ‘grande cobrança no Rock’ foi mesmo com os Strokes. Não me recordo de outra banda de Rock ter passado pela mesma cobrança após os nova iorquinos, quando, em 2003, lançaram Room On Fire, álbum que sucedeu o grande Is This It?, de 2001. Os Strokes, naquele ano, eram apontados como ‘a salvação do Rock’ (ou como baluartes de um novo ciclo roqueiro, como se tudo o que aconteceu no Rock entre 1990 e 2000 fosse consequência do Nirvana). Talvez, apenas talvez, o Arcade Fire e o Arctic Monkeys tiveram alguma cobrança por seus segundos álbuns, ambos lançados pós surgimento dos Strokes.

Room on Fire pisa no caminho de pedras indicado por Is This It?, o que significa que os Strokes não necessariamente arriscaram muito musical e esteticamente falando. Estão lá as guitarras crocantes e melódicas, e os efeitos vintage sobre as mesmas, o baixo marcante e sinuoso de Nikolai Fraiture, e os efeitos distorcidos na voz de Julian Casablancas, que ainda soam ótimos aqui, mas que passaram a cansar depois daqui, pois toda banda de Rock parecia usar o mesmo efeito.

Naquela virada do século, o Rock garageiro dos Strokes representava não exatamente um frescor, mas não deixava de ser uma modernização do Rock garageiro dos anos 70. O grupo sintetizou em suas guitarras a Nova York do Television, Blondie, Talking Heads, dos Ramones e do CBGB’s – e notem que os exemplos citados não se reduzem somente ao Punk nova-iorquino.

O sucesso por eles conquistado permitiu, até, que a banda dispensasse o produtor Nigel Godrich, que havia já em seu currículo álbuns de bastante sucesso comercial, como OK Computer (do Radiohead, 1997) e The Man Who (do Travis, 2001), e já era apontado como uma espécie de ‘George Martin 2.0’. Casablancas não entrou em acordo com Godrich, chegou afirmar que a banda soava “sem alma” nas sessões com o produtor. A solução foi repetir o produtor de Is This It?, Gordon Raphael, com quem a banda já estava habituada.

Room on Fire, como dito, não soa distante da estreia, mas traz músicas mais apuradas, mais consistentes e lapidadas.

O álbum abre de forma brilhante, num misto de niilismo e negação da fama, já na primeira frase, urrada por Casablancas (“Quero ser esquecido, e não quero ser lembrado”), na sensacional “What Ever Happened?”, faixa que confirma a misantropia da banda, que segue, até os dias atuais, bastante antipáticos!

Essa antipatia, arrogância ou prepotência, chamem do que quiser, não é algo construído com a fama. Há um documentário chamado Meet Me In The Bathroom (título de uma das faixas de Room on Fire, que comento abaixo) que mostra a banda já avessa à mídia e fama durante o curtíssimo período de independência do início de carreira.

Na sequência, a ótima e enérgica “Reptilia” – o segundo single, é a urgência da juventude urbana e etílica traduzida em pouco mais de três minutos. Ganchuda, guitarrenta, berrada – dá pra afirmar que é um Rock perfeito!

Room on Fire tem um êxito: as músicas soam mais expansivas e melhor construídas. Isso faz com que o álbum não tenha o mesmo frescor da estreia, mas, em contrapartida, aponta para caminhos onde eles não ousaram pisar antes. A excelente “Under Control”, por exemplo, soa como uma tentativa de um soul sessentista, enquanto “12:51”, o primeiro single – com guitarras sintetizadas, vocais pretensiosamente preguiçosos, e palminhas -, abraça bandas como The Cars e Pretenders.

Há, na verdade, somente duas músicas que soam exatamente como a banda soava na estreia, e chega a ser curioso essas músicas estarem postas a esmo no meio do álbum. “Meet Me In The Bathroom” e “The Way It Is” (ótimo riff de guitarra, a la Dead Boys) parecem ter sido compostas na época de Is This It?, inclusive sendo “vazadas” antes das versões oficiais, uma prática que os Strokes praticamente inauguraram com o início dos compartilhamentos de arquivos MP3 naquela época.

Gosto bastante das guitarras de “The End Has No End”, o terceiro e último single do álbum, ainda que suas letras não façam o mínimo sentido pra mim! Talvez seja pelo solo – certamente vindo da mesma fôrma do solo de “The Modern Age”, do álbum anterior.

Isso meio que cativa o álbum: essa pretensão de soar despretensioso. Essa produção, que faz com que o álbum soe despojado. Essa não-estética, que é, na verdade, uma assinatura. Em Room on Fire, os Strokes fogem das armadilhas do jogo da repetição, e soam amadurecidos, ainda que com todos os clichês.

+++ Na coluna DISCOS & CAPAS, leia sobre a capa de ‘The New Abnormal’, do The Strokes

A partir daqui, passaram a soar excessivamente repetitivos e blasé, o frescor se perdeu e a banda nunca mais repetiu um álbum com o mesmo poder dos dois primeiros. Mas vale dizer, naqueles anos iniciais, num cenário com ótimas bandas como Interpol, Walkmen e Yeah Yeah Yeahs, eles reinaram como a principal banda de Nova York, quiçá do mundo.

Room on Fire completará 20 anos de seu lançamento em 28 de outubro.

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FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

ANO: 2003
GRAVADORA: RCA
FAIXAS: 11
DURAÇÃO: 32:15
PRODUTOR: Gordon Raphael
DESTAQUES: “12:51”, “Reptilia”, “The End Has No End”, “Under Control”, “What Ever Happened?”
PARA FÃS DE: Rock Alternativo, Garage Rock, Indie Rock ’00

 

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