‘Terror Twilight’ soa anti-Pavement, e nada poderia ser mais Pavement


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Em sua carreira, o produtor inglês Nigel Godrich trabalhou para artistas do calibre de Beck, U2, R.E.M. e Paul McCartney. Seu trabalho mais conhecido, porém, é OK Computer, a obra prima do Radiohead, de 1997. Godrich também produziu Terror Twilight, de 1999, o quinto e último (até então) álbum do Pavement [A banda anunciou o fim em 2000. Retornou em 2010 e, após novo hiato, retornou em 2020 e segue ativa, porém sem lançar nada novo].

Surgida no início dos anos 90, estrearam com Slanted and Enchanted. Com seu Indie Rock atonal, imperfeito, dismorfo e ruidoso, a banda recebeu predicados da imprensa como “a quintessência do indie rock”, e fez do álbum um dos mais influentes do estilo. De 1990 (início das gravações de S&E, que foi lançado em 1992) até chegar aqui, a banda nunca repetiu fórmula de um álbum para outro. Mas Terror Twilight indicava que o Pavement não vinha bem.

Stephen Malkmus, vocalista/guitarrista e líder da banda, ignorou as canções do guitarrista Scott Kannberg – também conhecido como Spiral Stairs – e usou na montagem final do disco apenas suas composições, diferente dos demais álbuns. Já Godrich tinha a proposta de polir o som do Pavement, de algo “lesado e ruidoso” para algo mais coeso, mas os desentendimentos entre banda se estenderam ao produtor, e as sessões foram caóticas.

Servindo como “banda de apoio” para um álbum apenas de Malkmus, o Pavement praticamente seguiu em inércia os rumos do álbum anterior, Brighten The Corners (1997), mas com contenção de guitarras, já que Malkmus e Spiral Stairs não se entendiam.

Exceto por “The Hexx”, e pelos refrões de “Billie”, as guitarras empregam uma função coadjuvante, como um verniz sonoro, deixando espaço para que Stephen Malkmus brilhe e adiante o que viria a ser seu primeiro álbum solo. Cada canção tem sua própria ambientação e, como é de se esperar da banda, o álbum é sutil, irônico, melodioso e excêntrico. Mas também paradoxal.

A versão inicial do álbum contrariou o produtor. Godrich reclamou que o álbum soaria preguiçoso, maconheiro até, se iniciasse com “Spit On a Stranger”, e que deveria abrir com “Plattform Blues” (que conta com a participação de Johnny Greenwood, do Radiohead, tocando gaitas). Malkmus contrariou não apenas o início, mas toda a montagem do álbum – algo que seria repensado em 2022 quando a banda relançou o álbum com o nome de Terror Twilight: Farewell Horizontal, e com a ordem proposta por Goodrich, além de faixas de Kannberg descartadas da versão original.

Acontece que todas essas imperfeições e imprecisões tornaram o ‘último álbum’ da banda um registro agridoce e melancólico, e esse talvez seja o apelo maior aqui. A identidade permanece, ainda que o som não tenha ruídos, tenha polimento e uma estrutura mais comum, comparado ao incomum Pavement. A graça é que, mesmo em frangalhos, a banda consegue se reinventar e entregar um álbum que emociona por razões inesperadas.

“Ann Don’t Cry” é delicada. Delicadeza que se ouve no single “Major Leagues”, a melhor do álbum. Adoro a delicadeza com que se percebe a palheta correndo corda-a-corda na primeira nota dessa canção. “You Are A Light” é a cara da banda, ainda que não pareça com absolutamente nada que a banda tenha feito. “Carrot Rope” é animada, e anuncia os futuros trabalhos solos de Malkmus.

Ser bem produzido fez os fãs julgarem Terror Twilight imperfeito. Mas, ser um álbum imperfeito e diferente é, também, paradoxal, ao menos para essa banda.

+++ Leia a coluna Clássicos com ‘Slanted and Enchanted’, do Pavement

A ironia e a imperfeição que o Pavement sempre propôs durante sua existência.

Mas, passados quase 24 anos de seu lançamento, uma audição atenta indica que o Pavement, em frangalhos, ainda sabia muito bem o que estava fazendo.


Pavement-Terror-Twilight-Capa

 

 

Ano | Selo: 1999 | Matador Records
Faixas | Duração: 11 | 44:14
Produtor: Nigel Godrich
Destaques: “Spit On a Stranger”, “Major Leagues”, “Billie”, “Carrot Rope”
Pode agradar fãs de: Indie-Rock, The Fall, Beck

 

 

 

 


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