‘Sweet Heart, Sweet Light’, do Spiritualized, é tão esplendoroso quanto perigoso


Quando Jason Pierce montou o Spiritualized, no início dos 90, o Rock inglês parecia pendular entre o Madchester e o Shoegaze. Em sua nova banda, Pierce uniu os elementos psicodélicos do Spacemen 3 ao então Rock Britânico em voga, e também acrescentou orquestrações épicas, dramaticidade e atmosferas sonoras. Assim, fez do terceiro álbum do Spiritualized, Ladies And Gentlemen We Are Floating In Space (1997), um dos álbuns definitivos do Rock inglês de todos os tempos.

Desde seus tempos no Spacemen 3, Pierce (aka Jason Spaceman ou J. Spaceman) canta o desespero humano, os amores em desacordo, refúgios onde não há refúgio, e o consumo de substâncias que podem te tirar disso tudo (e levá-lo para lugares ainda piores).

A ideia para seu sétimo álbum, Sweet Heart, Sweet Light (2012) surgiu quando o Spiritualized fez alguns shows tocando sua obra-prima de 97 na íntegra. Na época, Pierce, um cara que canta e tenta trazer alguma beleza aos piores sentimentos humanos, passava por um tratamento quimioterápico por conta de um “probleminha” (segundo o próprio) no fígado. As drogas não surtiam efeito – a heroína gerou resistência – e doses mais fortes eram aplicadas.

Inicialmente, o disco se chamaria “Huh?”, em referência aos efeitos da quimio, mas o título acabou tendo referência religiosa – ou antirreligiosa (vai saber!?) – e é este o mais próximo que a banda produziu de música pop em sua discografia. Tanto que o site Pitchfork declarou que esse era o álbum mais “animador” do Spiritualized em anos. Já eu não diria animador, mas palatável, digerível.

O primeiro single escolhido foi “Hey Jane”, que gerou um vídeo controverso com tensas imagens de sexo, violência e consumo de drogas. Com seus quase nove minutos, tem toda uma atmosfera mezzo épica mezzo Velvet Underground, e a canção é ótima. Em muitos momentos, as metáforas do álbum giram em torno de “correr na estrada com um automóvel”, e o vídeo expressa um pouco disso visualmente.

Em “Little Girl”, o outro single do álbum, Pierce começa dizendo que “às vezes queria morrer, pois só os vivos sentem dor…”. E a partir daí, o calvário junkie, o desespero e desprendimento religioso tomam conta do álbum. “Too Late” tem todo um climão Gospel, e fala dos conselhos que a gente recebe pra encarar o mundo cruel, que nunca seguimos e quebramos a cara. “Freedom” é outro momento esplêndido do álbum, ainda que as metáforas possam te levar para um fundo de poço suicida.

A trinca final do álbum soa como louvores, ainda que Pierce conflite com o Divino com suas duras palavras: “Mary”, ainda que não seja diretamente religiosa, sugere falar à mãe de Jesus; “Life is a Problem” tem refrão acachapante e desesperador, e um descrente Jason falando com Deus, sabendo que não vai aos céus reencontrar os que se foram; a última canção do álbum, a épica “So Long You Pretty Thing”, soa como uma canção de ninar e um pedido de ajuda a Deus – a filha de Pierce, Poppy, que na época tinha 11 anos, o ajuda nessa canção, colaborando para a comoção.

+++ Leia a notícia sobre o lançamento de ‘Everything Was Beautiful‘, do Spiritualized

Grandioso, repleto de orquestrações, metais, camadas sonoras que se revelam a cada audição atenta, Sweet Heart, Sweet Light é tão esplendoroso quanto perigoso, e esse é o jogo que Jason Pierce e seu vocal claudicante gosta de propor para seu público. E a gente sadicamente aceita.

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FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

ANO: 2012
GRAVADORA: Double Six
FAIXAS: 11
DURAÇÃO: 59:30
PRODUTOR: Jason Pierce
DESTAQUES: “Hey Jane”, “Little Girl”, “Freedom”, “So Long You Pretty Thing”
PARA FÃS DE: Neo-Psicodelia, Space-Rock,Spacemen 3, The Brian Jonestown Massacre

 

 

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