Filho de pai argelino e mãe brasileira, o cearense Karim Aïnouz reflete em Marinheiro das Montanhas a metade de suas origens, portanto, uma parte de si e do que lhe foi negado.
Seus pais se conheceram em Washington, quando sua mãe Iracema, bióloga marítima que estava nos Estados Unidos realizando seu mestrado, encontrou Majid, que também estava no país por fins acadêmicos. O plano de fundo dessa história é a década de 1960. Após viverem meses (ou anos, Karim não especifica) juntos, Iracema retorna grávida para um Brasil ditatorial e Majid volta para a Argélia, recém liberta do imperialismo francês. Majid promete que levará Iracema e Karim para seu país, mas isso nunca ocorre. Mais de 50 anos depois, Karim embarca em um navio para a Argélia, realizando um documentário cheio de camadas através de uma linguagem simples e narração enfadonha em voz-off.
Dentro de um barco partindo de Marselha em direção à terra de seu pai, Karim opta por mostrar as imagens e narrar como se estivesse realizando um diário de viagem especialmente para sua mãe, o que guiará toda a construção documental do projeto. Nesse sentido, sua imagem é escondida de todo o filme (uma escolha acertada), assim como também não vemos longas cenas, especialmente entrevistas. É como se Karim realmente quisesse exibir para sua mãe, já falecida, as pessoas, o idioma, dificuldades estruturais, hábitos, monumentos e montanhas que, por pouco, não foram incorporados à identidade cultural de ambos. Desse modo, em boa parte do filme, ficamos restritos a assistir compilados de fotografias e cenas curtas, filmadas geralmente depois de Karim perceber algo.
Retomando ao ponto anterior, é preciso ser observado que Karim não prioriza uma naturalidade, principalmente quando a câmera é voltada a pessoas. Nesse ponto, contando sempre com uma distância entre uma ‘‘realidade’’, ou seja, uma imagem que sugere que foi capturada na hora, ele opta por atrasar, impor cenas que indicam que foram facilmente repetidas inúmeras vezes. Essas escolhas evidenciam uma atmosfera de um futuro perdido, de um lugar que só ficará vivo em registros, de duas pessoas (agora apenas uma) que não deixarão marcas, são meras visitantes, independente de quão simbólico o local pode ser para elas. É um lamento que, às vezes, tais imagens, lindas em significado, são prejudicadas pela narração do próprio Karim, que se divide entre apresentar desnecessárias descrições e vaguear entre reflexões curtas, que buscam mais impactar, criar frases de efeito, que propriamente apresentar um pensamento mais concretizado sobre e do autor.
+++ Leia a crítica do documentário ‘Louder Than You Think’, sobre Gary Young (Pavement)
Exibido em Cannes em 2021, Marinheiro das Montanhas é um filme simpático, que cativa pela simplicidade, mas deixa o sentimento de muito potencial perdido.
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FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:
TÍTULO ORIGINAL: Marinheiro das Montanhas
ANO: 2021
GÊNERO: Documentário
PAÍS: Brasil
IDIOMA: Português
DURAÇÃO: 1:35 h
CLASSIFICAÇÃO: —
DIREÇÃO: Karim Aïnouz
ROTEIRO: Karim Aïnouz, Murilo Hauser, Heitor Lorega
ELENCO: —
AVALIAÇÕES: IMDB
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