‘Batem à Porta’ é Shayamalan em ótima forma, mas sem os típicos plot twists


Batem à Porta, filme Shyamalan

Mesmo após ter dirigido vários ótimos filmes, o cineasta M. Night Shyamalan parece ter sempre algo a provar. O público costuma receber cada nova obra do diretor com justificada desconfiança, afinal ele próprio se colocou nesta posição delicada ao dirigir algumas bombas memoráveis ao longo de mais de 40 anos de carreira.

Porém, ao analisarmos o conjunto de sua obra, facilmente percebemos que ele possui muito mais acertos do que erros. São filmes que quase sempre estabelecem muito bem o clima de suspense e mistério e possuem a assinatura forte do diretor, com planos muito bem elaborados, com uma movimentação horizontal mais lenta da câmera, uma cinematografia que invariavelmente brinca com fundos desfocados e closes extremos no rosto dos atores à medida em que os diálogos se tornam mais densos. Neste quesito ele tem se mostrado extremamente bem sucedido, tanto que é comumente referenciado por inúmeros outros diretores contemporâneos.

Dentre os pontos altos de sua carreira podemos citar: O Sexto Sentido (1999), Corpo Fechado (2000), Sinais (2002), A Vila (2004), A Visita (2015), Fragmentado (2016) e, felizmente, o seu mais novo projeto, Batem à Porta (2023).

Trata-se de um filme adaptado do livro A Cabana no Fim do Mundo, de Paul Tremblay, e traz duas camadas bem distintas. Na camada mais superficial existem batidas narrativas requentadas sobre invasão domiciliar e fim do mundo, que poderiam facilmente passar despercebidas não fosse o talento imenso de seu diretor em criar desconforto e tensão constante.

Numa camada bem menos visível, praticamente metafórica, o filme provoca uma reflexão sutil e necessária sobre os enormes sacrifícios pessoais que as minorias fazem e são submetidas diariamente apenas para manterem o mundo girando.

Na história, uma família composta por dois pais e uma filhinha adotiva se isola na tal cabana, referenciada no título do livro, para passar uns dias de férias, até que são surpreendidos por invasores armados que, com pinta de fanáticos religiosos em surto, informam que o Apocalipse está em curso, mas que tudo pode ser evitado se aquela família se submeter ao que seria uma duvidosa e violenta exigência “divina”.

Cena do filme 'Batem à Porta', de Shyamalan

Shyamalan tomou a decisão arriscada de já entregar toda a trama nos primeiros minutos de filme, começando pela chegada dos invasores para estabelecer logo o conflito e a partir daí preencher a história com alguns flashbacks aparentemente aleatórios. Essa decisão faz com que o filme pareça esticar sua premissa ao máximo e dá uma sensação de desgaste da trama ao decorrer de seus 100 minutos de duração.

Por outro lado, o citado conflito faz com que seja impossível desgrudar os olhos da tela em busca de respostas, e mantem eficazmente o interesse dos curiosos. Porém, a medida em que as dúvidas colocadas vão sendo respondidas, a trama vai perdendo a força inicial, denunciando um roteiro que, se fosse melhor trabalhado, poderia brincar muito mais com as percepções sobre o que é fato ou delírio.

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Mas Shayamalan não deseja complicar a trama principal, muito pelo contrário, recorre até a explicações e a um didatismo excessivo que pode até incomodar uma audiência que se julga mais intelectualizada, o que nos leva diretamente para o campo das metáforas. E é justamente neste ponto que o filme realmente brilha e ganha o peso inesperado de um subtexto que é basicamente sobre a ignorância da natureza humana, mas que fatalmente, por conta desta mesma natureza, não chegará a todos com o mesmo significado ou a mesma força.


Poster do filme Batem à Porta

Título Original | Ano: Knock at the Cabin  | 2023
Gênero: Suspense, Mistério, Terror
País/Idioma: Estados Unidos/Inglês
Duração: 1:40h
Classificação: 16 anos
Direção: M. Night Shyamalan
Roteiro: M. Night Shyamalan, Steve Desmond, Michael Sherman
Elenco: Dave Bautista (Leonard) , Jonathan Groff (Eric), Ben Aldridge (Andrew), Rupert Grint (Redmond), Nikki Amuka-Bird (Sabrina) e outros
Avaliações: IMDB| Rotten Tomatoes

 

 


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