“Banda santista mostra personalidade em seu segundo EP”
Encontrar seu próprio som é um desafio para qualquer banda. Muitas perseguem ao longo de toda a carreira e não conseguem. Encontrar seu som significa fazer algo com feições próprias, com a sua cara. Não significa, necessariamente, algo novo, diferente de tudo que foi feito, mas, a despeito de referências/influências, fazer algo seu, distinguível como tal.
Em seu segundo EP, o trio santista Amphères apresenta o que pode ser o produto mais acabado do seu som e, se não o é, faz bem a transição entre o homônimo EP, onde ainda não era discernível uma proposta sonora clara (mesmo com muitas ideias interessantes), e o que pode vir a ser seu terceiro EP ou seu primeiro álbum.
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Duas mudanças contribuíram de forma significativa para tudo que foi dito: a opção por cantar em português, embora nem todas as faixas sejam exclusivamente em português, e ter a baixista Paula Martins como a principal vocalista da banda. Sobre passarem a cantar em português, a descoberta de um universo de bandas nacionais cantando em português (e bem), como um fator que motivou a seguir por esse caminho. Nem todas as letras são em português, “Sobre 2 Cm” tem uma curta letra em inglês e “A Dança” mistura inglês e português.
Se no primeiro EP a banda gravou no estilo ao vivo, em “Dança” tiveram um cuidado maior, inclusive contaram com Aécio de Souza (baterista da banda Bloodbuzz e dono do Estúdio Aurora) na produção, em conjunto com a banda.
O resultado é que as boas ideias já apresentadas no EP anterior soam melhor desenvolvidas e acabadas, e a Amphères consegue soar mais próxima da Amphères.
“Glacial”, a faixa de abertura, mistura de momentos delicados com outros mais furiosos embalado por riffs de guitarras distorcidas que parecem estar em um duelo pelo protagonismo. “A Dança”, cujo belo videoclipe merece menção e atenção (inclusive pela interpretação da dançarina Thaïs Caniati), com uma cadência de tango, guitarras envolventes e baixo denso, que parecem sugar o ouvinte para dentro da canção.
Em “Wax”, com marcação de baixo e riffs que lembram Pixies, a letra remete ao mito de “Ícaro” que, com asas de cera, tentava fugir da ilha em que se encontrava aprisionado junto com seu pai, mas não ouviu o conselho, voou mais alto do que deveria e teve as asas derretidas pelo sol, caindo no mar. Se “Dança” faz a ligação com outra manifestação artística (mais ligada a música em si), “Wax” serve de elemento de ligação para com a pintura, especificamente do pintor francês Henri Matisse, já que seu quadro “Dança” foi usado como referência para a capa do EP, dando também o título.
É um disco de andamento cadenciado, onde a cozinha (Paula Martins/Jota Amaral) segue pelo caminho das marcações, às vezes das melodias sinuosas, para que a guitarra de Thiago Santos tenham liberdade para explorar recursos diversos, seja em riffs distorcidos, texturas, solos concisos ou feedbacks, algo marcante, por exemplo, em “2018”, cuja letra fala muito sobre nosso momento atual, principalmente sobre a maneira como as pessoas se apresentam intolerantes e cheias de ódio nas redes sociais, assunto que Beto Cupertino (Violins) já havia tocado na faixa “Memes” em seu álbum “Tudo Arbitrário” (2017). Por seu lado “Sobre 2 cm”, a faixa mais curta inclusive a letra, é essencialmente instrumental e apresenta um bem vindo dueto entre Paula e Thiago, num resultado interessante.
Se essa “pegada” será a tendência nos próximos lançamentos da Amphères só o tempo irá dizer, independente disso, o que nos fizeram encontrar aqui foi um EP interessante, o que não se resume apenas aos aspectos técnicos e musicais, mas de ideias como um todo, o que é bastante salutar.
NOTA: 8,0
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:: FAIXAS:
01. Glacial
02. A Dança
03. 2018
04. Sobre 2 cm
05. Wax
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:: Assista abaixo ao vídeo de “A Dança”:
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