“Trio de músicos experientes abraça a música do mundo num trabalho bem interessante”
Com todos os adventos tecnológicos que temos, com troca de ideias em redes sociais e blogs, na agilidade dos meios de comunicação, sabemos qual a música que temos tanto numa tribo africana ou mesmo numa festa de adolescentes do bairro. Não podemos negar que hoje a música é acessível a todos. A arte se universalizou e entrou num processo de assimilação de outras culturas. A todo instante, sabemos dos shows que acontecerão ao redor do mundo e os lançamentos musicais que podem chacoalhar com a mídia.
A música sempre abraçou vários segmentos e gêneros, sem nunca ter vergonha disso, sem nenhum preconceito. Com essa aproximação de fronteiras e através da interação de pessoas de diferentes países e ávidos por outras sonoridades, fácil ter uma sonoridade nigeriana dos anos 70’s convivendo harmoniosamente com guitarras comuns da escola musical inglesa. Como se opostos se atraíssem, não há como negar a ideia de que vários gêneros ou mesmo culturas musicais distintas podem conviver bem. Às vezes só precisa de um artesão pra realizar isso, ou então que o ouvinte seja menos conservador e esteja aberto para a junção de ideias.
Existe quem ainda torce o nariz para a World Music. Engraçado que, na maioria das vezes, são pessoas que sequer procuraram se aprofundar melhor no gênero. Criticam sem antes conhecer um pouco. Artistas como Paul Simon, David Byrne e atualmente Damon Albarn (Blur, Gorillaz), sempre tiveram essa sede de vasculhar, de estudar a música que sai de outros lugares. Aqui, para o nosso texto, quem brinca de misturar sonoridade mundial é o trio Dirtmusic. Os exploradores são: o australiano Hugo Race, que tocou com Nick Cave And The Bad Seeds, o americano Chris Eckman (do The Walkabouts) e o turco Murat Ertel (bastante conhecido na cena musical psicodélica daquele país). Todos bons e virtuosos músicos.
Com toda essa reunião de culturas, carregando uma bagagem musical de peso e sentindo gosto pela música, o trio faz um trabalho que preza pela universalidade musical e nos pede para termos menos preconceito com a cultura musical mundial.
São sete faixas revelando o quanto a música pode quebrar barreiras, chegar até você, se expandir, conscientizar, revigorar. Se notarmos o título das canções, percebemos como são usadas palavras que exprimem afastamento: border, distance, foreign (borda, distancia, estrangeiro). Trazem letras engajadas que andam juntas com a situação atual. Um mundo ainda cercado por barreiras, com arames farpados e muros, isolando ou restringindo talvez bons músicos que poderiam ser como os três grandes artistas desse trio, que possuem méritos de alçar voos e ultrapassar territórios.
Apesar do Dirtmusic trazer bastantes aspectos da música psicodélica, seria errôneo dizer que assim eles pensaram na criação do álbum, o grupo traz todo esse histórico musical que adquiriram: folk, música árabe, pitadas suaves de eletrônica, tribalismo, nem mesmo a ex-banda de Hugo passa despercebida. Há um pouco de Nick Cave And The Bad Seeds em algumas faixas, porém isso não afeta o poder criativo de nossos artesãos, pelo contrário, acrescenta mais poder de fogo e ideias. Por um momento, lembram algo de The Durutti Column em ‘The Border Crossing’, ou mesmo certa inspiração do New Order fase ‘Movement’ (1981) na linda, e uma das minhas canções preferidas de 2018, ‘Go The Distance’.
O instrumental é bem delineado para a proposta do disco, melhora ainda mais com bons fones de ouvido. Cítaras e guitarras trabalham em conjunto, a percussão é essencial e os vocais conseguem exprimir a melancolia de letras pungentes e conscientizadoras que algumas canções trazem, como em ‘Love Is A Foreign Country,’ com a etérea voz da cantora turca Gaye Su Akyol. Por sua vez, ‘Safety In Numbers’ ganha um ritmo mais rápido, contornos de pop-rock, toma um refrão grudento e o vocal feminino é da cantora canadense Brenna MacCrimmon.
Penso que o disco perca em alguns quesitos. Não para mim, porém para alguns ouvintes. A abertura com ‘Bi De Sen Söyle’ pode não agradar muitos, alguns podem desistir pela ‘estranheza’ do som ou por uma atitude sonora que não apela para mídia e seus burburinhos. Tem sido pouco comentado nas redes sociais e, por incrível que pareça, é um dos trabalhos mais interessantes de 2018 até agora. Caso você faça parte do grupo de exploradores como nossos três artistas fazem, sinta-se à vontade e abrace por um momento de sua vida a música que abraça o mundo.
:: NOTA: 8,2
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:: FAIXAS:
01 – Bi De Sen Söyle
02 – The Border Crossing
03 – Go The Distance
04 – Love Is A Foreign Country
05 – Safety In Numbers
06 – Outrage
07 – Bu Bir Ruya
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:: Mais Informações: Bandcamp, Facebook, Site Oficial
:: Assista ao vídeo de ‘Bi De Sen Söyle’:
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