‘This Woman’s Work’ é uma carta de amor a música, em especial a produzida por mulheres


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Os anos 90 foi um autêntico desbunde para os aficionados pela música. Para quem viveu a década e foi formado como eu (musicalmente falando) o período é marcado por uma lista infindável de grandes discos (dos variados gêneros) que contribuíram para definir o que foi esta década efervescente.

Na seara do Rock, a qual fui educado / doutrinado pelos meus pares, gêneros como o Grunge, o Indie, o Alternativo e o Nu Metal foram alguns dos quais estabeleci memórias musicais as quais permanecem vivas até hoje. Porém, o maior ponto ruptura (e de enorme aprendizado para mim) foi tomar conhecimento da música produzida por mulheres.

Num mundo masculinizado, ter acesso a artistas como o Hole (via o essencial “Live Through This”) e ao clássico disco de estreia de Alanis Morissette (“Jagged the Little Pill”) foram essenciais para pensar que a música poderia / deveria ir além dos arquétipos sexistas que, salvo raras exceções, dominavam as paradas de sucesso e o dial das rádios.

Ouvir o que Alanis e Courtney Love (e mais tarde Liz Phair, Kathleen Hanna, PJ Harvey…) tinham a dizer fizeram com que eu não só repensasse a sociedade ao meu redor, mas que também percebesse o quão o mundo era injusto e machista, fazendo com que em diversos segmentos da sociedade seja mais difícil de ser ver uma mulher ocupando uma posição de liderança ou tendo o protagonismo devido. E foi a partir daí que comecei a buscar mais por vozes que, de alguma forma, buscavam romper com este malfadado paradigma.

Na ala do jornalismo musical, ler o trabalho feito por Sara Marcus sobre o movimento Riot Grrrl (no essencial “Garotas à Frente”) foi um autêntico despertar para que eu pudesse perceber que dentro do Jornalismo é perceptível um movimento de mudança, que faz com que, cada vez mais, surjam escritoras e obras incríveis que abordam o universo da música nos mais diversos campos. E o mais recente “achado” nesse campo é This Woman’s Work, título que, por sinal, faz menção a canção icônica de Kate Bush.

Editado por Kim Gordon (ex-Sonic Youth) e a escritora irlandesa Sinéad Gleesson, a obra reúne 16 ensaios escritos por um time diversificado de vozes femininas como as de Anne Enright, Fatima Bhutto, Jenn Pelly, Rachel Kushner, Juliana Huxtable, Leslie Jamison, Liz Pelly, Maggie Nelson, Margo Jefferson, Megan Jasper, Ottessa Moshfegh, Simone White, Yiyun Li, Zakia Sewell e as duas editoras citadas.

De maneira apaixonada, cada ensaio é uma rara e, por vezes, tocante oportunidade de ver como a música (das mais variadas vertentes) cumpre o papel de transformar realidades globalmente, seja no Japão ou na Síria. Além de prestar justas homenagens a artistas consolidados como Laurie Anderson e Lucinda Willians, cada texto funciona como um convite ao leitor (a) para conhecer outros tantos como Boredoms, UFO or Die, Noor Jehan e Linda Sharrock. Inclusive, vale a audição da playlist criada por Sineád disponível no Spotify (OUÇA AO FINAL).

+++ Leia sobre o livro ‘Fingers Crossed – How Music Saved Me From Success’, de Miki Berenyi

Merecidamente, This Woman’s Work figurou em diversas listas de melhores livros do ano (como a da Pitchfork) e tem como grande mérito mostrar o real poder que a música tem no nosso quotidiano, servindo de alento / conforto para momentos difíceis ou como instrumento de mudança política / social.


 

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