“A importância da música instrumental nas mãos do grupo de Fortaleza que merece ir mais longe”
Tenho um tio muito fã de música que certo dia me disse: ‘a música pode ser feita usando uma simples caixa de fósforos’. Verdade. Com um singelo toque de dedos na superfície de tal objeto, somos capazes de criar uma melodia ou mesmo de executar uma percussão marcante. Assim vale para um assovio, uma batida de pé, o tamborilar de dedos ou então até o velho abridor de garrafas batendo em copos e criando aquela diversidade de sons e timbres. Penso o mesmo para a música instrumental, gênero esse que na minha adolescência tinha repulsa – digamos não repulsa – mas sim, possuía ainda na minha sensibilidade uma não identificação com a ausência da linguagem verbal, da letra, daquele refrão ganchudo.
Com o tempo, assimilei o que era a importância da música instrumental. Passei a procurar mais sobre bandas que seguiam essa linha. Vasculhei, pesquisei, absorvi. Alguma coisa não me interessou, muito me cativou e até hoje tenho como referência algumas bandas maduras nesse processo, a exemplo do Mogwai. Quem vai por esse caminho e que abre 2018 sendo bem comentada e divulgada nas redes sociais é a banda Astronauta Marinho, de Fortaleza. O grupo não é tão novato assim, já possuía na bagagem o EP ‘Fartozalê’ (2012) e o álbum ‘Menino Sereia’ (2014). ‘Perspecta’, o trabalho mais recente, traz um som aprimorado, bem produzido, mergulhado em gêneros como jazz, afrobeat, post-rock e, claro, não deixa de lado a sonoridade do sertanejo tradicional do Nordeste.
Um disco que busca ampliar sonoridades, não tem medo de ousar, espera proporcionar ao ouvinte uma descoberta em cada faixa mesmo dentro de uma dinâmica instrumental.
‘Só’ é a única cantada e que foge do objetivo de criar um álbum totalmente instrumental. Numa espécie de junção entre Violeta de Outono e The Durutti Column, a canção traz percussão e guitarra dedilhada num conjunto inesquecível para o ouvinte. A mansidão que abre ‘Vaai’ é apenas uma (feliz) armadilha para as guitarras que entram abruptamente. ‘Banzai’ tem um contorno mais pop-rock, com uma batida que conquista de cara e que deve ser a canção para se apresentar a banda para algum amigo. ‘Da Peur’, a mais enérgica do disco, fecha os instante finais com guitarras densas e que não fariam falta em algum disco do Sonic Youth como ‘Sister’ (1987). A todo instante notamos influências e referências, aqui e ali, mas nunca culparemos o grupo dizendo que ele se apoderou de apenas uma influência, pois o leque é múltiplo. De Mogwai a Explosions in the Sky, Astronauta Marinho faz sua trajetória sonora sem soar alguma banda em específico.
O álbum saiu numa parceria entre os selos Mercúrio Música (Fortaleza) e Dafne Music (São Paulo). O quarteto é formado por Felipe Couto, Guilherme Mendonça, Daniel Lima e Caio Cartaxo. O grupo diz que o processo de criação do álbum foi feito pensando na vida cotidiana e urbana de cada um dos membros. Grupo que pode (e merece) ir longe e que certo dia pensou como meu tio: música não precisa nem de palavras, precisa apenas ser a ponte coesa e segura entre a pessoa que a cria e a pessoa que vai recebê-la, não importa a forma como foi criada.
::NOTA: 7,5:
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::FAIXAS:
01 – NQSWV
02 – Banzai
03 – Vaai
04 – Só
05 – Pontos Flutuantes
06 – DaPeur
07 – Cabeça de Peixe
08 – Cariri
::MaiS Informações:
Bandcamp
:: Assista apresentação da no Estúdio Showlivre:
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