‘Ecstasy and Wine’, o disco não autorizado do My Bloody Valentine


Foto do My Bloody Valentine em 1987

“O disco estava por toda a Europa, e não sabíamos de nada até que alguns fãs vieram até nós e disseram: ‘Este novo álbum não soa tão bom quanto o seu último’. Eles pensaram que era um álbum novo porque era datado de 1989. Então eles [da gravadora] enganaram as pessoas fazendo-as pensar que era um novo disco”, contou Shields em uma entrevista de 2005.

O guitarrista detalhou o que fez após saber da situação: “Fatty (roadie do Primal Scream) e 14 outros caras armados foram comigo ao escritório da gravadora onde todos os discos estavam guardados. Eles tinham cerca de 10.000 cópias. Bati na porta, entrei sozinho, e o cara da gravadora estava sentado atrás da mesa e disse: ‘Bem, você pode pegar o que puder’. E eu acenei chamando esses 14 malucos. O rosto do cara da gravadora ficou branco, e ele sabiamente apenas disse: ‘Pode levar’. Em 20 minutos, saímos com cerca de 10.000 discos em uma van e dissemos ao cara, ‘Apenas nos deixe em paz, e não voltaremos mais aqui’”.

A história refere-se edição, não autorizada pela banda, do álbum/compilação Ecstasy and Wine, lançado em fevereiro de 1989, pela Lazy Records. O disco saiu pouco tempo após Isn’t Anything (11/1988), lançado pelo então selo da banda, a Creation Records, e que teve boa repercussão de público e crítica: “O selo aproveitou para capitalizar em cima de nosso sucesso”, afirmou Shields.

Voltando no tempo, para o ano de 1987 – divisor de águas na história da banda -, logo após a saída de Dave Conway, primeiro vocalista da banda, o MBV fixou Bilinda Butcher na guitarra e vocais. Fechava-se assim o que viria a se tornar a formação definitiva com Kevin Shields (voz e guitarra), Debbie Googe (baixo) e Colm O’Ciosoig (bateria).

Voltando um pouco mais no tempo, em 1984 o MBV resolveu sair de seu país natal e se mudou para a Holanda. As lembranças de lá não são muito boas, conseguiram fazer apenas um show. Pouco tempo depois deslocaram-se para a Alemanha e lá conseguiram seu primeiro registro “This Is Your Bloody Valentine”, um mini-álbum de 7 faixas lançado pela gravadora Tycoon.  A banda faria um retorno para a Holanda, lá permanecendo por pouco tempo, até mudarem-se para a Inglaterra, onde lançariam dois EP’s ainda com Savage, The New Record By My Bloody Valentine (1986) e Sunny Sundae Smile (1987), seus derradeiros trabalhos.

O primeiro registro com Bilinda foi o single Strawberry Wine, e na sequência o mini-álbum Ecstasy, lançados em agosto e novembro de 1987, respectivamente, pelo selo Lazy Records.

My Bloody Valentine, Ecstasy and Wine
(Strawberry Wine, Ecstasy e Ecstasy and Wine)

Esses registros mostram a banda distanciando-se da sonoridade presente em trabalhos anteriores, fortemente marcados pela influência de Cramps e Birthday Party, e aproximando-se mais do que viriam a mostrar no álbum de 1988. A sonoridade de algumas canções seguem num curioso estilo Jangle-Pop que jamais seria encontrado nas músicas dos irlandeses novamente. Na época, Shields estava fissurado por uma guitarra de 12 cordas que havia adquirido, e também pela música do The Byrds: “Eu tinha acabado de comprar uma guitarra de 12 cordas e estava muito apaixonado por ela. Eu também tinha acabado de descobrir os Byrds. Todas as músicas eram muito ‘jingly jangle’. Sem falar que foi a primeira vez que eu cantei em um estúdio também. Então eu estava cantando baixinho e mal apenas tentando estar afinado”.

Em fevereiro de 89, a Lazy Records, sem conhecimento da banda e numa jogada esperta, resolveu reunir as canções de Strawberry Wine (“Strawberry Wine”, “Never Say Goodbye” e “Can I Touch You”) e Ecstasy e lançá-las no que para muitos parecia um novo álbum do My Bloody Valentine, Ecstasy and Wine, com uma nova capa e um total de dez faixas. O detalhe é que a versão de “Strawberry Wine” que foi colocada no disco é um mix alternativo, diferente da versão do EP.

+++ Leia Esse Eu Tive Em Vinil sobre Isn’t Anything, do My Bloody Valentine

O resultado, além do descrito nos dois primeiros parágrafos, é que o disco acabou se tornando item de colecionador e raríssimo, algo inimaginável pelo líder da banda na época, que viria a contar o que fez com a pilha de 10.000 cópias: “Nós vivíamos deles. Quando terminamos a turnê em 1992, fomos dispensados pela Creation. Várias grandes gravadoras tentaram nos contratar depois, mas colocamos em nossas cabeças que queríamos sobreviver por conta própria por algum tempo. A essa altura, tínhamos uma má reputação por levar muito tempo no estúdio, então era nossa maneira de dizer: ‘Olha, na verdade somos bastante funcionais, não precisamos de ajuda de ninguém’. Então, quando terminamos a turnê, tínhamos todas essas caixas de discos, e nós os vendemos por 700 libras a caixa para vários distribuidores. Então nós vivemos desses registros por um tempo”.

Abaixo você pode ouvir Ecstasy and Wine, não disponível nos serviços de streaming.


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