‘Every Loser’ é sopro de vitalidade na carreira de Iggy Pop


Foto de Iggy Pop para resenha de Every Loser

Iggy Pop tem história na música. E que história! Ela está registrada ao longo de sua não tão extensa discografia, onde podem ser encontrados alguns discos clássicos. Para além disso, o Iguana, como também é conhecido, construiu uma reputação inescapável a partir de sua presença de palco, marcada pelo uso intenso do corpo, seja através de automutilações públicas ou performances com um nível de fisicalidade e confrontação pública inimagináveis para muitos front man. Somado a isso, períodos de envolvimento pesado com drogas e uma fase praticamente na sarjeta.

Apesar dos excessos e vales em sua carreira, Iggy ainda é um ícone, um ídolo que segue aqui entre nós, um sobrevivente, alguns dirão. O fato de manter-se na ativa, lançando álbuns, por si só, é algo a ser celebrado tanto por quem segue acompanhando sua trajetória musical quanto por quem, em algum ponto de sua longeva e tortuosa carreira, resolveu abrir mão da música composta pelo “padrinho do Punk”.

Para os últimos, a advertência de que os dois álbuns anteriores do músico, cada qual ao seu modo, são trabalhos bastante consistentes. Post Pop Depression (2016), produzido e composto com a ajuda de Josh Homme (do QotSA), emula seus momentos mais luminosos da década de 70 e 80; enquanto Free (2019) mostra uma interessante e inusitada faceta, com canções lentas e soturnas, algumas com approach jazzístico e experimentações – um caminho em que as guitarras foram deixadas de lado e pode não agradar aos mais ortodoxos.

Para quem prefere Iggy no que se pode chamar de habitat natural, à frente de canções com mais “pegada”, Every Loser tem alguns desses ingredientes.A ideia de um álbum voltado para sonoridade esporrenta, como mostrado no feroz single “Frenzy”, se desfaz ao longo do percurso.

“Frenzy”, assim como “Neo Punk” são os dois únicos momentos de maior crueza do disco. Na primeira, Iggy berra que está em frenesi e já abre a canção (e o disco) cantando que “Tenho um pau e duas bolas, isso é mais do que todos vocês / Minha mente ficará doente se eu sofrer as picadas / Então cale a boca e me ame, porque a Diversão é minha amiga / Todos os tubarões no mar estão esperando por mim”, numa letra cuja a mensagem tem endereço certo. “Neo Punk” é mais crua e direta (musicalmente falando), espécie de alerta do septuagenário Iggy de que ainda tem lenha para queimar, ao tempo que dá aquela alfinetada no que o Punk se tornou: “Tenho um Rolls-Royce personalizado, sou um neo punk / Tenho uma mancha na voz, sou um neo punk”. Seu sorrisinho de maroto de satisfação/diversão ao final deixa isso bem claro.

Se no álbum anterior Iggy tinha como parceiro de composições e produção Leron Thomas, músico de carreira construída no Jazz, aqui é Andrew Watt (que compõe e toca guitarra), jovem produtor com um currículo de colaborações que inclui Eddie Vedder, Elton John e Miley Cirus, Justin Bieber, só para citar alguns. As participações especiais contam nomes como Dave Navarro,Josh Klinghoffer. Chad Smith, Duff McKagan, Travis Baker (Blink 182), Eric Avery (Janes Addiction), Stone Gossard (Pearl Jam). ALguns destes formam a banda de apoio de Iggy, o The Loosers.

O falecido baterista Taylor Hawkins aparece nas faixas “Comments” (com a bateria ao estilo Stephen Morris, do Joy Division/New Order), em que Iggy despeja seus sentimentos em relação às redes sociais e “The Regency”. Na balada “Morning Show”, Iggy imposta uma voz cavernosa e assume o eu lírico para falar de um artista que se retira da ribalta, mas que cumpre com maestria sua função até o último instante: “O palhaço que você amava está morto”, “Vou consertar minha cara e seguir”, são algumas frases da canção.

Entre “rockões” poderosos como “Modern Day Ripoff” e “All the Way Down”, homenagem a Andy Warhol (The News for Andy) e à cidade de Miami (New Atlantis), críticas às redes sociais, e canções de vibe oitentistas, o novo disco de Iggy Pop é um sopro de vitalidade em sua carreira, mostrando um vigor verborrágico e musical incríveis. E o disco e reserva para o final uma das canções mais incríveis, “The Regency”, com um trabalho de bateria vigoroso de Hawkins e interessantes timbres de guitarra, algo marcante também em “Strung Out Johnny”, outra das canções com um quê oitentista.

+++ Leia sobre a compilação ‘I’ll be Your Mirror’, tributo ao Velvet Underground

Every Loser soa como um disco aberto, sem preocupação com uma coesão interna que parta do início ao fim. É um direcionamento diferente dos trabalhos anteriores, onde era perceptível que os pontos de partida e chegada se uniam. Aqui o “seguir o fluxo” é a tônica, compor canções e colocá-las todas num disco. A persona (voz) de Iggy, no fim, harmoniza tudo e dá sentido maior ao álbum.


Capa de Every Loser, de Iggy Pop

INFORMAÇÕES:

LANÇAMENTO: 06 de janeiro de 2023
GRAVADORA: Gold Tooth/Atlantic Records
FAIXAS: 11
TEMPO:  36:57 minutos
PRODUTOR: Andrew Watt
DESTAQUES:  “Frenzy”, “Modern Day Rip Off”, “Comments”, “The Regency”
PARA QUEM CURTE: Iggy Pop, Rock’n’Roll
CURIOSIDADES: A ideia de ler notícias de jornal para a faixa “The News For Andy (Interlude)”, segundo Iggy, veio de uma conversa em que ele teve com Andy Warhol na época das gravações de Funhouse.


 

Previous 'O Ataque ao Capitólio' mostra como a luta pela Democracia é árdua e ininterrupta
Next Feito em oito dias, 'If You're Feeling Sinister' é um clássico contemporâneo

No Comment

Leave a reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *