‘Loss of Life’ é o resultado de período de mudanças no MGMT


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MGMT | Foto: Jonah Freeman

Quinto álbum do MGMT, ‘Loss of Life’ traz canções lentas e baladas, enfatizando bases simples mas arranjos adornados com camadas sonoras

Talvez o rótulo de Pop Psicodélico seja a definição mais aproximada para o MGMT, mas ele não dá conta de todas as referências encontradas na música composta pelo duo, seja no novo Loss of Life ou qualquer outro de seus quatro álbuns antecessores. A verdade é que a Psicodelia vinda dos sixties, com conexões com a lisergia dos trabalhos de Syd Barret (do Pink Floyd), é apenas uma das muitas vertentes que coexistem na música do MGMT. Um olhar mais atento encontrará grandes traços do Synthpop oitentista, flertes com o Glam-Rock setentista (Bowie e Roxy Music), com o Indie-Rock dos anos 2K e com a Neo-Psicodelia dos 90/2K, esbarrando em nomes como The Flaming Lips, Animal Collective, Panda Bear e também nomes contemporâneos como Tame Impala outros.

Essa faceta diversificada é algo que vem desde a estreia com o surpreendentemente aclamado Oracular Spetacular (2008), produzido por Dave Fridmann (Mercury Rev, The Delgados, The Flamings Lips) e que trouxe os hits “Time to Pretend”, “ELectric Feel” e “Kids”, e apresentou a dupla Andrew VanWyngarden e Ben Goldwasser para o mundo.

Após uma seqüência de álbuns em que a dupla se permitiu dar uma variada em sua sonoridade, principalmente em Congratulations (2010) – que teve produção de Peter Kember (AKA Sonic Boom), do Spaceman 3 -, o MGMT passou a trabalhar com o produtor Patrick Wimberly em seu quarto álbum, Little Dark Age (2018), gestado num período de turbulências políticas que adentraram as músicas desse disco, inclusive a faixa título, um Synthpop de tons oitentistas que conclama as pessoas e se posicionarem e agirem – que acabou sendo apropriada por grupos de direita no Tik-Tok.

Em Loss of Life, o MGMT, em alguns aspectos, retorna a sonoridade de seu primeiro álbum mas com uma reduzida nos BPM’s das canções, entregando um álbum introspectivo e composto essencialmente de baladas e canções atmosféricas – sentimento reforçado pelo título do novo trabalho: “perda de vida”.

Tendo Wimberly novamente como produtor, e o colaborador de longa data Fridmann responsável apenas pela mixagem, o novo trabalho guiado em grande parte pela melodia da guitarra acústica, mas rico em camadas sonoras, elementos musicais que surgem e se vão e dão novas dimensões aos arranjos – assemelhando-se ao estilo de produção pela qual Fridmann se tornou conhecido e requisitado -, algo comum na música do MGMT.

“Loss of Life 2” abre o álbum com a leitura de I am Taliesin, um poema inglês do século VI, por um professor de inglês. A faixa inicial, junto com a que conclui o álbum, “Loss of Life”, pretende sublinhar a ideia de início e fim e como elas estão intimamente conectadas, e busca amarrar o conceito de e do álbum. Ao longo de dois minutos, a voz vai sofrendo alterações, processamentos, mudanças de pitch, efeitos que dão dinâmica ao andamento da leitura, que é acompanhada por uma melodia bucólica sintetizada e, quando cresce e parece que vai crescer, simplesmente diminui e acaba abruptamente.

“Mother Nature”, um dos singles do álbum, é uma bela balada em que o MGMT admitiu ter algo de Oasis, embora seu arranjo de cordas e o estilo vocal nos remeta algumas décadas atrás, aos Beatles. É uma faixa grandiosa e, centrada numa melodia reconfortante, que cresce e emociona também pelos vocais suaves, enquanto a letra fala não apenas sobre natureza, mas também sobre amizade: “Mas você precisa de um amigo / Para te levar para casa / Você tem que começar de novo”, ideia reforçada pelo videoclipe que mostra a amizade entre uma tartaruga e uma raposa. A canção tem a participação do guitarrista Neils Cline, do Wilco.

Com “Dancing In The Babylon”, que tem a presença da francesa Redcar (Christine and the Queens), a dupla retorna ao seu lado multifacetado num arranjo que é uma verdadeira montanha-russa, quase como uma suíte, com arpegios de sintetizador de timbre oitentistas (assim como o eco usado na bateria), pianos, guitarras suingadas e mudanças de andamento. É o que se pode chamar de uma verdadeira apoteose sonora.

Vivendo uma “nova fase”, o MGMT que encontramos em 2024 não é aquele que debutou em 2008, com jovens na casa dos 25 anos. Quarentões, o duo experimentou muito, como banda: após quatro álbuns de estúdio, eles saíram de um grande gravadora (a Columbia) e estão em um pequeno selo; e como indivíduos: Andrew se tornou pai recentemente.”Phradie’s Song”, com participação de Britta Phillips (Luna) soa como uma canção de ninar, com canto quase sussurrado, barulhos de sinos infantis ou sino de vento, é uma pungente declaração de amor a sua filha de dois anos: “O sol da manhã está em suas mãos / E eu cantarei para você / Todas as noites, se você quiser”, ao tempo que fala sobre a (re)descoberta do amor: “Eu sonhei antes? / Parecia que eu não poderia mais amar”.

Apesar do título, de canções mais lentas e climáticas, em Loss of Life, luz é uma palavra que aparece em muitos momentos, como que um sintoma dessa nova fase em que a dupla se encontra, com um olhar mais positivo (de esperança), em contraste com a “pequena era das trevas” que se espalhou pelo trabalho de 2018. “A vida continua / Mostrando coisas que você não pode deixar de ver…E assim que o sol aparece novamente / Algo está bloqueando a luz / Mas está tudo bem”, são versos presentes em “People In The Streets”, canção de veia acústica, mas que, como quase todas do disco, é adornada por camadas sonoras, aqui com ênfase em synths vintage.

“Bubblegum Dog” tem participação de Sean Lennon nos teclados e é uma composição da época de Little Dark Age que acabou não entrando no disco. É uma balada com toques de Glam-Rock, incluindo bateria espalhafatosa e cheia de viradas, incluindo um solo com aquele timbre característico dos anos 70; enquanto “Nothing to Declare” remete ao bucolismo de canções de Simon & Garfunkel e uma bonita harmonia vocal, talvez a canção menos intricada do disco (“A luz das estrelas nunca vai me decepcionar”), mas ainda cheia de barulhinhos de fundo.

“Nothing Changes” é mais uma balada com uma instrumentação densa e vocal sóbrio ao estilo de Brett Anderson (Suede) e a própria instrumentação, em crescendo, remete à banda de Brett, que assim como o MGMT bebe no Glam-Rock oldschool.

Alguém já declarou que o MGMT compõe canções animadas com letras tristes, se a afirmação pode ser tomada como verdadeira algum momento da carreira deles, em Loss of Life eles fazem letras esperançosas para canções reflexivas, sem necessariamente soarem triste. O encerramento com a climática “Loss of Life” (com toques de Air), faixa que dá título ao álbum, retoma a ambientação de “Loss of Life 2”, com sintetizadores densos e um retorno ao início, dissertando sobre o ciclo da vida e a importância do amor, outro tema muito presente no disco: “Quando o mundo nasce e a vida está acabando / Então você aprende a amar sua perda de vida / Quando a manhã chega e a vida acaba / Qualquer um pode amar / Qualquer um pode amar”.

+++ Leia a crítica de ‘American Head’, do The Flaming Lips

Pop Psicodélico? Nada disso, em Loss of Life, o MGMT oferece um leque de influências e referências que vai muito além do Pop e do Psicodélico, mostrando-se em constante mutação dentro de seu próprio universo musical, que abrange as diversas épocas da música Pop, e, no fim, soa como a visão deles mesmos para tudo isso. E, apesar de conseguir se comunicar com um público mais jovem, ainda valorizam o conceito de álbum.

"Nothing to Declare", do MGMT, também está em nossa Playlist de 2024

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FICHA TÉCNICA E MAIS INFORMAÇÕES:

ANO: 2024
GRAVADORA: MGMT Records / Mom + Pop
FAIXAS: 10
DURAÇÃO: 45:13 min
PRODUTOR: Daniel Lopatin, MGMT, Patrick Wimberly
DESTAQUES: “Mother Nature”, “Phradie’s Song”, “Nothing Changes”
PARA FÃS DE: The Flaming Lips, Mercury Rev, The Delgados, Animal Collective, Psicodelia

 

 

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