Katie Dey canta romances embasados pela tecnologia e o paradoxo real/virtual


Katie Dey, resenha Mydata

Uma análise sentimentalista construída através de fragmentos distorcidos que criam uma roda de diálogos com o ouvinte.

A cantora e compositora australiana Katie Dey está de volta com seu Pop experimentalista com texturas no psicodelismo e batidas eletrônicas. Elementos e atributos que atraíram olhares para a artista. Seus três álbuns anteriores Asdfasdt (2015), Flood Network (2016) e o não tão distante distante Solipsisters (2019), definem a atmosfera e a base desse novo trabalho, características que abrem uma porção de leques para adentrar em Mydata, seu mais novo disco de inéditas.

O álbum foi concebido totalmente de forma caseira, detalhe que orna perfeitamente com o momento no qual vivemos, e destaca o talento da cantora em lidar com produções mais modestas que beiram a simplicidade. Algo que realmente dificulta a classificação da música feita por Katie. Isso já fica evidente na cativante e atmosférica “Darkness”, canção que abre o disco com batidas eletrônicas, sintetizadores que criam uma atmosfera nostálgica e bucólica. Uma canção que resume e já deixa claro o contexto do álbum.

As canções aqui soam simples, e embora a sonoridade do álbum remeta a obras anteriores da cantora, é perceptível o amadurecimento das composições, com versos mais fortes e bem construídos: “Não estou mentindo desta vez, não/Eu quero vida com menos dor/Sem sofrimento, sem mais fome”, excogita a cantora em “Happiness”. Música que entrega bons momentos melancólicos e de profundo sentimentalismo.

O álbum traz uma narrativa bem atual e tecnológica. Aborda relações amorosas através da Internet e rede sociais, e traça um olhar positivo sobre essas ferramentas tecnológicas e o quanto elas podem aproximar pessoas distantes.

Apesar da melancolia e ambientações psicodélicas, esse olhar otimista feminino sobre relações baseadas no conceito digital faz de Mydata um álbum positivo e menos baixo astral do que as obras anteriores da cantora. O que fica mais evidente em “Bearing”, que de forma singular fala sobre essa tal felicidade de amores pela Internet: “Assombrado na internet/Tocando instrumentos falsos/ Cantando músicas uns dos outros/Arrastando nossos corpos ao longo”, diz a letra.

E talvez essa seja a diferença mais perceptível em relação aos trabalhos anteriores da cantora: abordar o sentimentalismo por outro ângulo. Algo bem oportuno para o momento que vivenciamos. Tempos de isolamento social, pandemia, em que as relações se tornaram individuais, o afeto resiste através do “contato virtual”. Ouvir as músicas de Mydata é como ver-se diluído em uma conversa através computador ou até mesmo pelo celular. Um universo cada vez mais presente em nossas vidas.

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O eu lírico aqui ganha voz tecnológica, embasada por sintetizadores e efeitos eletrônicos que reforçam ainda mais o contexto proposto pela temática do álbum.

“Algum dia eu vou te encontrar e encontrar meu coração”, diz a letra de “Leaving”, uma canção simples que ganha força nas linhas de sintetizadores e elementos eletrônicos que deixam a voz de Dey repleta de anseios e vitalidade, e que transborda por cima das tempestades criadas nas filosofias emotivas de arranjos digitais distorcidos.

Mydata é fruto de um mundo pandêmico, onde fomos forçados a afastar e nos afastarmos das pessoas que amamos e nos isolar das relações diárias e rotinas de passeios no parque, sentar em uma mesa para dialogar com amigos. Katie Dey conseguiu capturar a essência do que pode ser o amor sem o toque, sem o contato físico. Compôs um álbum temático, sem grande urgência, mas que soa honesto e cativante. Um registro que vai agradar muito quem curte Alex G e Porches.

DESTAQUES: “Darkness”, “Happiness” e “Leaving”.

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OUÇA O ÁLBUM:


Assista ao videoclipe de “Darkness”:

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