Em ‘Automatic’, The Jesus and Mary Chain oferece distorções embaladas por batidas eletrônicas


The Jesus and Mary Chain, Automatic

Barulho ensurdecedor regado a distorções e microfonias. Suavidade acústica docemente melancólica. Beats, distorção controlada e sem as microfonias. Resumo da trinca de álbuns lançados pelos irmãos Reid nos ímpares e longínquos 85/87/89 do século passado. Inegável, o The Jesus and Mary Chain surpreendeu nas três ocasiões – embora nem todos tenham gostado da surpresa.

Quem gostou da barulheira, ganhou suavidade; quem embarcou na suavidade, foi presenteado com distorções controladas impulsionadas batidas eletrônicas às vezes pesadas. Um bom observador, se antecipou e encontrou nos singles a chave, os desavisados torceram a boca. Mas tudo que está aí, é o que sempre esteve na superfície das canções do JAMC: arranjos construídos no violão com poucos acordes e melodias certeiras. Adornos diferentes, e resultados diferentes, mas a essência continua.

Se a recepção não foi das melhores quando Automatic foi lançado, o tempo tratou de mostrar o quanto o mesmo foi mal compreendido. Black Francis entendeu, pegou “Head On” e fez sua própria versão para o álbum Trompe Le Monde (1991). Mostrou que a alma da música dos escoceses permanecia intacta e confundiu a quem já não sabia se preferia a versão dos Pixies ou a original. Se isso não for suficiente, a enxurrada de bandas que trilharam pelo caminho proposto pelos irmãos Reis atestam que, sim, Automatic mais até que Darklands, tornou-se um álbum muito influente, um paradigma para um sem número de grupos.

Para os mais “puristas”, a birra foi com as batidas eletrônicas, que lhes esbofeteou a cara e fez corar de vergonha com a sua banda predileta “se vendendo”, se tornando Pop (?).

Esses mesmos que coraram com a banda do ex-JAMC, Bobby Gillespie e seu Primal Scream em Screamadelica, a ser contada em outro momento. Peraí, em qual tipo de Pop é possível colocar qualquer das canções de Automatic? Aquele que toca como trilha sonora em programas de Surf ou Skate? Aquele que toca nas rádios comerciais? Aquele que vende milhões de cópias? Aquele que lota estádios? Bem, o da primeira pergunta até acontece, os outros, sem chance.

O próprio Jim Reid se dizia irritado com acusações de terem se vendido, comparando as vendas com Psychocandy, que na época havia vendido bem mais. É uma banda diferente, não só por terem limado baterista (“Gimme Hell” é a única faixa que tem baterista) e baixista e assumido a produção do disco, ou por colocar os vocais à frente dos instrumentos, mesmo quando a distorção assume volumes mais elevados, diferente de Psychocandy, que soterrava as vozes entre a massa de barulho tornando-o apenas mais um elemento. É uma banda diferente porque, como disse o próprio Jim, foi de alguma forma tocada pelo “music business”. Foram contaminados? Volte ao parágrafo anterior.

Olhado com calma e com a perspectiva de mais de três décadas, Automatic é um álbum quase perfeito, daqueles que muitas bandas (desculpem o clichê) dariam um dedo qualquer coisa para terem composto. Indie-Dance? Influências de Hip-Hop? Tentativa de soar comercial? Que diferença faz? O desafio é: encontre uma canção ruim no álbum.


O ÁLBUM EM VERSÃO ESTENDIDA:


O VIDEOCLIPE DE “BLUES FROM GUN”:

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2 Comments

  1. Ângelo
    09/10/2021

    Muito boa essa análise da “trinca de ás” do início da carreira da banda, com enfoque no Automatic – parabéns!

  2. 09/10/2021

    Valeu, man. Obrigado pelo comentário e pela generosidade.

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