Duas resenhas para a série de Ficção | TALES FROM THE LOOP (2020)


Tales From The Loop, imagem da série

“Pretensiosa demais, série desperdiça uma ótima ideia e não mostra pra que veio”

Por Isaac Lima

Depois de conferir uma das grandes séries do ano passado, a espetacular The Boys, as expectativas estavam muito altas quanto ao novo produto do canal Amazon Prime Video. Tales From The Loop acabou chamando a atenção pela sinopse: Sci-Fi inspirada pelo livro e ilustrações do artista sueco Simon Stålenhag.

No ano de 1954, o governo sueco ordenou a construção do maior acelerador de partículas do mundo. A instalação foi concluída em 1969, localizada bem abaixo do campo pastoral de Mälaröarna. A população local chamou essa maravilha da tecnologia de The Loop.

Juntando o livro e suas ilustrações, Stålenhag apresenta os subúrbios suecos da década de 1980, povoadas por máquinas fantásticas e animais estranhos. O retrato de Stålenhag de uma infância em um cenário de carros e macacões antigos da Volvo, combinado com máquinas estranhas e místicas, cria uma atmosfera única que é instantaneamente reconhecível e totalmente estranha. O livro apresenta as imagens juntamente com textos que contam as histórias dos jovens que viviam nas sombras das máquinas. Infelizmente o livro não foi lançado por aqui, apenas versões importadas, mas buscando na internet consegue-se ver algumas dessas ilustrações.

Tales From The Loop, imagem da série

Partindo dessa premissa, fica ainda mais difícil de entender como a adaptação do livro e de suas imagens não deu certo.  Por mais que seja um livro de ilustrações, com textos explicativos dos desenhos, havia uma história a ser contada e que poderia servir como ponto de partida para a narrativa.

A serie é contada em forma de antologia. Se passa em um bairro fictício de Ohio, construído acima do The Loop, uma máquina construída para “explorar os mistérios do universo”. O Loop é enorme e, embora empregue a maioria dos moradores que vivem acima dele, poucos sabem a extensão total do que se passa dentro de seus limites. Tudo o que sabem é que o trabalho realizado lá mudou a textura de suas vidas. Algumas dessas mudanças são evidentes e intencionais, como avanços na tecnologia, que cria membros robóticos, tratores suspensos e mecânicos ambulantes comuns. Mesmo apresentando um elenco recorrente de personagens e tramas sobrepostas, cada episódio funciona como um conto independente.

Com produção executiva do próprio Stålenhag e de Mark Romanek, responsável pelo excelente Não me Abandone Jamais, a série tal como as ilustrações, tem um cuidado técnico que salta aos olhos.

As composições são belíssimas, com planos sempre abertos para demonstrar o tamanho daquele ambiente. Nos primeiros episódios, a fotografia apresenta incríveis paisagens naturais em planos perfeitamente simétricos, fazendo com que os personagens sejam o centro das ações naquele mundo os envolve.

O episódio piloto, dirigido também por Mark Romanek, captura todas questões abordadas nas pinturas de Stålenhag,  filmado de forma poética, consegue transparecer uma certa sensibilidade.

E assim vai se desenvolvendo durante toda a temporada, histórias são contadas, muitas delas não tendo o aprofundamento dos personagens que a história exige. Não que o produto tenha que apresentar tudo mastigado, mas que pelo menos esclareça certos pontos para que o espectador possa chegar a suas próprias conclusões. Personagens deixam de existir sem que uma explicação plausível possa aparecer.

Tales From The Loop, imagem da série

Os episódios tem premissas bastante interessantes: a mãe de uma garota desaparece e deixa para trás um estranho artefato em “Loop”; um garoto ouve vozes vindas de um globo estranho em “Echo Sphere”; e em “Parallel”, um homem tropeça em outro universo. O que se segue é um drama terno que parece uma peça, cada um dedicado principalmente à solidão.

A série é pontuada por uma trilha sonora delicada. Alguns podem reclamar por ser um tanto quanto cadenciada demais. Os personagens me parecem sempre muito frios e distantes, não se importando com todos os eventos que acontecem a sua volta. Confesso que foi uma coisa que me incomodou bastante. Mesmo disfarçada de antologia, a série não apresenta uma unidade satisfatória nos episódios, e ao final dos oito episódios a sensação que se tem é que o seriado tinha um potencial muito grande para discutir questões como relatividade do tempo, finitude da vida, solidão, relações entre pessoas, mas o resultado é um programa pretensioso com belíssimas imagens e travestido de um Sci-Fi Cult, mas que não consegue sustentar uma narrativa.

Desperdiçou-se um imenso potencial, provando que nem só de belíssimas imagens uma obra áudio visual consegue se sustentar. Fica a torcida para que os roteiristas entendam a premissa e consigam explorar melhor as ideias de Stålenhag em uma futura temporada.

NOTA: 6.0


“Antologia revigora uma característica fundamental da ficção científica que andava esquecida nas produções atuais: a filosofia”

Por Eduardo Juliano

O que acontece com os seres humanos quando as leis naturais da vida são alteradas?

Esse é o questionamento central que move os oito episódios da intrigante e contemplativa antologia de ficção cientifica do Amazon Prime Video, que como em toda boa produção filosófica, não está necessariamente interessada em dar respostas, mas em propor novos questionamentos.

É fato que as obras de ficção científica e a filosofia são inseparáveis desde seu surgimento, porém nos últimos anos viu-se uma ascensão da “ação Sci-Fi”, seguida pelo “terror Sci-Fi”, em filmes de extremo sucesso e eis que de repente a Ficção Científica encontrava-se distante do seu alicerce.

Tales From The Loop, imagem da série

As produções do gênero deixaram de propor questionamentos filosóficos em prol de um maior alcance popular. Vide, como exemplo, a trilogia Matrix, que conseguiu unir filosofia e ação brilhantemente em seu primeiro filme, mas que focou apenas na ação mirabolante em seus dois últimos capítulos.

Tales From The Loop faz o caminho inverso. A série abandona quase que totalmente a ação e aposta todas as fichas na filosofia. O ritmo propositadamente lento das narrativas contribuem para que o espectador possa ter o tempo necessário para absorver e contemplar os conceitos propostos que versam sobre o tempo, o amor, a amizade, a morte, dentre outros.

Para construir o mundo “futurista” da série, o design de produção buscou inspiração nas ilustrações do livro homônimo do visionário artista sueco Simon Stålenhag, que basicamente insere robôs, edificações e equipamentos estranhos em paisagens bucólicas comuns.

Interessante notar a falta da tecnologia que consumimos hoje em dia, como smartphones, internet, televisores de led, etc. É como se fosse possível uma mistura de um passado remoto, mais precisamente da década de cinquenta, com inserções tecnológicas de épocas vindouras ainda desconhecidas.

A cada episódio um personagem que era secundário assume o protagonismo e vive histórias, que apesar de serem aparentemente independentes, compartilham o mesmo mundo e as consequências acabam reverberando umas nas outras, tecendo assim uma humanamente belíssima e melancólica colcha de retalhos.

Tales From The Loop, imagem da série

As histórias se passam em uma cidadezinha do interior dos Estados Unidos, sob a qual foi construída uma empresa tecnológica por todo subsolo. Essa empresa possui uma máquina chamada Loop que é capaz de desafiar a lógica e subverter as leis físicas universais, o que acaba expondo os habitantes da cidade a fenômenos metafísicos estranhos e suas consequências irreversíveis.
Ou seriam os desejos obscuros dos habitantes que estariam na verdade impulsionando o Loop a subverter as leis universais?

No livro A Insustentável Leveza do Ser, o autor Milan Kundera aborda o mito implacável do “eterno retorno”, que consiste basicamente na lei de que tudo vai se repetir pois o tempo e o universo são infinitos, porém os eventos que ocorrem são finitos, logo, estes se repetem de forma igual toda vez que acontecem, por toda a eternidade.

Talvez essa seja a essência dos contos do Loop, que principalmente em seu primeiro e último episódio, retratam esse fenômeno de maneira desafiadora e sutil, como se passado, presente e futuro fossem uma coisa só. E por passar com extrema competência essa “verdade”, através de diretores e atores extremamente competentes, essa é, desde já, uma das melhores séries de ficção do ano.

NOTA: 8.5


NOTA DOS REDATORES:
EDUARDO SALVALAIO: –
LUCIANO FERREIRA: –
MARCELLO ALMEIDA: –
MÉDIA: 7.3


LEIA TAMBÉM:

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RESENHA: STRANGER THINGS | 2017


Tales From The Loop, poster da série

:: FICHA TÉCNICA:

Gênero: Drama, Sci-Fi
Temporadas: 01
Duração: 50 a 57 minutos aproximadamente
Direção: Jodie Foster, So Yong Kim, Charlie McDowell, Tim Mielants, Mark Romanek, Andrew Stanton, Dearbhla Walsh e Ti West
Roteiro: Nathaniel Halpern e Simon Stålenhag
Elenco: Daniel Zolghadri, Rebecca Hall, Paul Schneider, Ato Essandoh, Jonathan Pryce  e outros
Data de Lançamento: 03 de abril de 2020 (Brasil)
Censura: 18 anos
Avaliações:  IMDB | Rotten Tomatoes

 

 


:: Assista ao trailer:

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