‘California Deluxe’ traz versões mais dignas e ousadas


O ano de 2017 já fechou suas portas, deixando inúmeros lançamentos que surpreenderam e desapontaram. Mas porque escolher falar de uma versão Deluxe de um álbum lançado por uma banda de Pop Punk noventista enquadrada como Emo (?) em meados de 2004, “adestradora de adolescentes”? O que torna California Deluxe tão especial para merecer tempo de escrita e o seu de leitura?

A princípio a quantidade de faixas: dez inéditas, além de “Hey I’m Sorry”, presente apenas na versão japonesa do álbum, e “Bored to Death”, dessa vez no formato acústico, totalizando assim doze faixas, o que já o coloca no patamar de um outro álbum, se pensarmos apenas em números. Mas não para por aí.

Ainda tomados pela busca de uma regressão sonora, mas com certa liberdade mais que válida, o Blink-182 entregou ao público em maio de 2017 o que deveria ser considerado apenas como um conjunto de sobras do processo de gravação de seu último álbum, California, lançado em julho de 2016. Mas, como resultado, encontra-se uma banda com o laço do old blink, um pouco mais frouxo do que no próprio (ambos produzidos pelo John Feldmann, do Goldfinger). Assim, desfrutamos de gratas surpresas dignas de álbum principal e execuções ao vivo.

A maior delas através da faixa “6/8”, que recebeu tal nome por conta do tipo de compasso de tempo nunca utilizado pela banda em suas composições, e se tornou sem sombra de dúvidas uma das canções mais originais do grupo desde o retorno em 2009, e o lançamento de “Neighborhoods” em 2011. Remete inclusive ao frescor, desprendimento e ao experimento de novas nuances, características bem notórias e empolgantes do álbum de 2003, meu favorito, inclusive.

“Last Train Home” é aventureira e pesarosa em significado e melodias. Talvez uma das mais instigantes desse recomeço do Blink. Dá margem a boas expectativas, assim como “6/8”. “The only time I feel alive is when I find something I would die for” (O único momento que me sinto vivo é quando encontro algo pelo qual eu morreria), entoa Mark Hoppus no refrão.

Já “Long Lost Feeling” é mais uma prova viva de que o Mark caminha muito bem na escrita mais intimista e melancólica. O adolescente escrachado e piadista já chegou na casa dos quarenta, e o tempo inevitavelmente transforma algumas coisas. Felizmente há quem faça bom proveito disso.

Em “Bottom of The Ocean” flertam corajosamente com o eletrônico e o corpo de bateria, principalmente no refrão, remete a faixas do Plus 44, projeto que Barker e Hoppus mantiveram durante o hiato da banda. “Parking Lot”, “Wildfire” e “Can’t Get You More Pregnant”, essa última com apenas 35 segundos, formam um trio de tentativas quase bem sucedidas de alcançar o Blink que ficou para trás, resultando em réplicas genéricas de seu passado e a sensação de “falta alguma coisa aí”.

Um ponto unânime desde Enema of The State (1999) é a identidade, versatilidade e técnica do Travis Barker na bateria, bem evidenciadas também aqui, independente da recepção de cada álbum. Sem dúvida ele proporcionou uma revolução na banda desde a saída do Scott Raynor no fim dos anos 90, fazendo-a desvencilhar-se aos poucos do estigma de Punk Rock carregado do início. Do Punk sem bandeiras e nada politizado. Mas regado de humor, indecente e escrachado muitas vezes. Um conjunto de aventuras e desventuras da adolescência, ou seja, o estigma vinha da fórmula sonora, ainda que, expondo minúcias inconfundíveis que foram construindo a trajetória até aqui.

Outro aspecto positivo é que nota-se uma doação mais generosa, comparando-o com as faixas que saíram em California. Perceptível nas contribuições de Matt Skiba, seu membro mais recente e também vocalista e guitarrista da banda Alkaline Trio. Apesar de não atingir a criatividade e ousadia desprovida de virtuosismo impostas por Tom DeLonge até sua última contribuição antes de deixar a banda, lá no finalzinho de 2014.

O que não faltou aos que restaram, sem dúvida alguma, foi coragem. Quando, mais uma vez, ao abandono do barco por DeLonge, parar no percurso tenha sido novamente uma alternativa, Travis e Mark decidiram seguir remando. Há quem defenda a incorruptibilidade de uma essência, mas ela se transforma, abraça outras nuances, enquanto a matéria matriz segue ditando o norte, e não quem renuncia dela.


FAIXAS:
01. Parking Lot
02. Misery
03. Good Old Days
04. Don’t Mean Anything
05. Hey I’m Sorry
06. Last Train Home
07. Wildfire
08. 6/8
09. Long Lost Feeling
10. Bottom Of The Ocean
11. Can’t Get You More Pregnant
12. Bored To Death (Acoustic)


Previous Ride anuncia "Tomorrow’s Shore" EP :: Ouça "Catch You Dreaming"
Next Jack White lançará “Boarding House Reach” :: Ouça faixas novas

No Comment

Leave a reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *