THE KILLERS – Wonderful Wonderful (2017)


“The Killers ressurge com universo nostálgico em Wonderful Wonderful”

Lançando seu primeiro álbum pós-hiato e quinto da carreira, o The Killers deixa bem mais evidente seu flerte com o synth pop. Entre faixas dançantes e mais arrastadas, o quarteto norte americano sugere uma viagem ao tempo, como que propositalmente, para que seu público perceba as referências sem necessariamente fazer com que a capacidade de experimentar e inovar em seu próprio âmbito seja subestimada por ele. Facilmente captamos um clima oitentista que se estende por grande parte do álbum, o que de forma alguma se torna um ponto negativo.

Baixista de mão cheia, Mark Stoermer segue criando linhas memoráveis. “Wonderful Wonderful”, faixa título, já inicia o álbum com uma introdução de bateria sintetizada que abraça uma áurea densa guiada com muita maestria. Nos versos de introdução temos um Brandon Flowers muito próximo das linhas vocais de Bono Vox.

“The Man” é a faixa mais Disco Music de toda a obra. Refrão gostoso de ouvir, novamente, baixo bem colocado e embalando o decorrer da canção. Te transporta para a pista de dança sem largar os fones de ouvido. Está liberado imaginar-se com aqueles looks coloridos e vibrantes da era Disco.

O veneno da geração, depressão, é o foco de “Rut”. O Brandon não precisou ir longe ou muito menos compor por osmose baseando-se em histórias reais que sequer presenciou, sua mulher foi o elemento crucial para a existência dessa canção, já que ela sofre de estresse pós-traumático e alguns sintomas apresentados por sua esposa o preocupou a ponto dele optar por cancelamento de shows da banda em 2015. Entre palhetadas a la The Edge e um corpo melódico otimista, em contraste com o peso emocional da letra, temos uma das faixas mais interessantes do disco em questão.

Na parte do refrão de “Life To Come” a influência do The Edge nas guitarras é ainda mais nítida. Vocalmente, enfatizando os refrões, temos, mais uma vez, um “Brandon Vox”. Até que ponto os pitacos do líder do U2 direcionaram o “Wonderful Wonderful”? Acredito que não nesse aspecto, já que independente deles, vale ressaltar o espaço que o U2 ocupa na bagagem do Killers, ou seja, a influência pode ter sido tanto direta como indireta – “Read My Mind” do “Sam’s Town” sempre me remeteu a “With Or Without You” -, não necessariamente em sua totalidade, já que não estamos falando de plágio por aqui. Especulações e influências à parte, temos uma boa faixa, sem sombra de dúvidas.

“Run For Cover” é oitentista e Killers na melhor forma. Ao mesmo tempo que alguns aspectos da canção evocam o clima de “Maniac”, do Michael Sembello. Tem a explosão contemporânea do “Hot Fuss”, que segue como meu álbum favorito do quarteto de Nevada.

Em “Tyson vs. Douglas”, Brandon traz a tona uma memória frustrada, onde seu herói de infância, Mike Tyson, até então imbatível, foi nocauteado por Buster Douglas e de como isso mexeu com ele. “Mas você nunca crescerá, baby, se você não olhar”. Incrédulo e tendo que lidar com uma derrota que não era sua, mas era como se fosse, olhar (se dar conta dela) era o primeiro passo para superá-la. Em outros departamentos também não funciona assim? Melodicamente é sensacional, é enérgica e nostálgica por também trazer resquícios oitentistas.

Não satisfeitos com a influência direta/indireta do U2 no álbum, o que sentem ao constatarem que nele também há uma pitada generosa de Coldplay? Foi como “Some Kind of Love” soou para mim desde seu prelúdio.

“Out Of My Mind” é uma tentativa de repetir a mesma atmosfera sonora de “The Man”, mas como um raio não cai duas vezes no mesmo lugar (às vezes ele ignora essa regra, o que não foi o caso), deixa os esforços para o próximo álbum.

“The Calling” é quase uma faixa retirada de um álbum do Muse: guitarras mais agressivas mescladas com um synth pulsante. Seu prefácio é uma narração sob o comando do ator americano Woody Harrelson, mais conhecido por compor o elenco da saga ‘Jogos Vorazes’. Céu e inferno são os extremos exaltados nos versos, tal como a busca por um “sinal” do divino que indique o “caminho” e o que não falta é quem direcione, mesmo que no final não seja o desejado e sim o merecido levando em consideração o histórico de cada um. “A entrada para o reino está queimando demais” é genial!

Além de uns toques do Bono Vox, o “Wonderful Wonderful” teve o luxo de contar com a colaboração de Mark Knopfler, ex-membro e fundador do Dire Straits na guitarra em “Have All The Songs Been Writen?”, inclusive o parto dessa penúltima canção foi num momento nada fértil para a mente de Flowers. Ele tinha esse questionamento como uma frase solta, aparentemente sem rumo, até parar na caixa de e-mail do Bono, que enxergou potencial no trecho como título de uma canção – bem a cara dele, inclusive. Flowers assinou embaixo e o que temos hoje é uma música crescente, daquelas que esconde o jogo até explodir em êxtase nos momentos finais.

“Money on Straight” tem uma sutileza monótona, que não compromete o conjunto. Remete levemente ao country também. Presente apenas na versão Deluxe, ela é um discurso angustiado de desaprovação a costumes que ainda vigoram na educação americana, do homem ser instruído como um guerrilheiro, pela própria família e pelos que o cercam. Dando um passeio no histórico do Killers, em “All These Things that I’ve Done”, faixa do espetacular “Hot Fuss”, álbum de estreia da banda, há um trecho que resume bem essa aversão de Brandon: “Eu tenho uma alma mas não sou um soldado”, e quem se identifica, mesmo que levando para um outro contexto, acompanha o coro a plenos pulmões.

“Wonderful Wonderful” é um álbum humano, pessoal, o que o torna bem mais honesto, ousado. Como eles arriscaram! Esse leque de inspirações, referências e experimentos fez de cada canção um universo particular, mesmo se encontrando em pontos que a banda ainda mantém. Invejoso também, dançante, mesmo que não esteja na melhor forma, e “afilhado” do Bono Vox. Tá bom ou não tá?

:: NOTA: 8,0

:: FAIXAS:
01. Wonderful Wonderful
02. The Man
03. Rut
04. Life to Come
05. Run For Cover
06. Tyson VS Douglas
07. Some Kind of Love
08. Out of my Mind
09. The Calling
10. Have All the Songs Been Written?

:: Assista abaixo ao vídeo de “Run For Cover”:

Previous Iorigun mostra personalidade no EP 'Empty.Houses//Filled.Cities'; Ouça
Next LAU NAU – Poseidon (2017)

No Comment

Leave a reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *